STJ DEFINIRÁ LEGALIDADE DA INCLUSÃO DAS TARIFAS TUST E TUSD NA BASE DE CÁLCULO DO ICMS – O RISCO DE MODULAÇÃO DE EFEITOS E A POSSIBILIDADE DE DISTRIBUIÇÃO DE MANDADO DE SEGURANÇA
Após inúmeras ações judiciais questionarem a legalidade da inclusão da “TARIFA DE USO DO SISTEMA DE TRANSMISSÃO – TUST” e da “TARIFA DE USO DO SISTEMA DE DISTRIBUIÇÃO – TUSD”, de energia elétrica, na base de cálculo do ICMS, o STJ entendeu por correto submeter a análise da questão ao sistema de recursos repetitivos.
De início, faz-se necessário compreender duas situações: (1) Tanto o STF quanto o STJ tratam a energia como mercadoria (pois, na essência, é adquirida e utilizada); (2) há diferença entre “consumidores livres” e “consumidores cativos”.
Os “consumidores livres” são aqueles conhecidos também como “grandes consumidores”, geralmente pessoas jurídicas que tem grande demanda de energia elétrica (superior a 10.000 Kw), e que, portanto, optam (ou podem optar) por contratar seu fornecimento direto de produtor independente de energia elétrica. Estes “consumidores livres”, também podem dividir a forma de consumo, ou seja: adquirir a energia de uma determinada geradora, e a distribuição de outra determinada empresa distribuidora.
Já os “consumidores cativos”, são todas as demais pessoas físicas ou jurídicas que consomem energia elétrica em menor quantidade e, portanto, estão, necessariamente, vinculados às “distribuidoras concessionárias” que atendem a região geográfica de seus respectivos domicílios. Os “consumidores cativos”, não têm possibilidade de livre escolha entre o gerador e o distribuidor; o distribuidor concessionário é o único responsável por cobrar todos os custos e encargos de toda a cadeia (geração, distribuição e transmissão de energia elétrica).
Pois bem. Há longa data a tese sobre a inclusão das tarifas TUST/TUSD na base de cálculo do ICMS, na aquisição de energia elétrica (como mercadoria), é debatida no judiciário; um sem número de consumidores que se sentiram lesados pela inclusão de tais tarifas na base de cálculo do ICMS, provocaram o judiciário e tiveram êxito.
E assim surgiu a discussão: como dito no início, tanto o STJ quanto o STF têm entendimento pacífico de que a energia é mercadoria e o consumidor final é o contribuinte do imposto (ICMS).
Logo, os denominados “consumidores livres” ou “grandes consumidores”, passaram a requerer, judicialmente, que as tarifas TUST/TUSD, não fossem incluídas na base de cálculo do ICMS, pois, sob sua ótica, o contribuinte (consumidor final), somente deve ser instado a pagar o ICMS, por adquirir a energia elétrica em si (como mercadoria), não podendo ser incluído na base de cálculo do imposto, as tarifas de transmissão e distribuição (TUST e TUSD).
Instaurada a controvérsia nos Tribunais Estaduais, surgiu a necessidade de pacificação do entendimento. O STJ, naquela primeira oportunidade, decidiu pela não inclusão das tarifas na base de cálculo do ICMS, afirmando que tais tarifas “remuneram o exercício de uma atividade meio de transporte de energia elétrica”, fugindo da tipificação do tributo (AgRg nos EDcl no REsp 1.267.162/MG, AgRg no REsp 1.278.024/MG).
No entanto, após anos adotando o entendimento acima, e por questões que nos parecem puramente econômicas (alegada relevância da inclusão das tarifas na base de cálculo do ICMS para aumentar o orçamento dos Estados), o STJ, no EREsp 1163020/RS decidiu em sentido contrário ao já pacificado até ali, ou seja: as tarifas poderiam, sim, ser incluídas na base de cálculo do ICMS.
Foi uma votação apertada, na qual restou decidido que as tarifas devem integrar a base de cálculo do ICMS em razão da “indissociabilidade das fases de geração, transmissão e distribuição da energia elétrica”, sendo que o custo referente a cada etapa compõe o preço final, custo este que então que deve ser repassado aos consumidores.
E assim sendo, uma vez controvertida a questão e, sobretudo, considerando as inúmeras ações judiciais que discutem o tema, o STJ decidiu que todas elas serão julgadas através do sistema de repetitivos. Foram então selecionados três recursos sobre o tema, que serão julgados e definirão o futuro da questão: o REsp 1.692.023, o REsp 1.699.851 e o EREsp 1.163.020. O tema está cadastrado sob o número 986.
Referida decisão também determinou a suspensão, em todo o território nacional, dos processos pendentes, individuais ou coletivos, que versem sobre a questão.
Passado algum tempo, mais precisamente no início de julho de 2018, o Ministério Público Federal apresentou parecer favorável aos consumidores livres e desfavorável aos consumidores cativos.
Em resumo, o entendimento foi que, no mercado cativo, os custos de transmissão e distribuição são indissociáveis e previstos em contrato de adesão firmado entre a distribuidora e o consumidor, logo, devem compor o preço final da mercadoria (que é a base de cálculo do imposto); o consumidor livre, por outro lado, contrata de forma separada as redes de transmissão e/ou distribuição, fazendo com que o custo das tarifas não esteja previsto e, portanto, não deve compor o preço da operação final.
Para o MPF, portanto, somente no caso dos consumidores cativos as tarifas TUST e TUSD devem integrar a base de cálculo do ICMS.
Contudo, sabe-se do risco de, mesmo reconhecendo a tese favorável aos consumidores livres, o STJ aplicar “modulação de efeitos”, ou seja, afirmar que, de fato, as tarifas não devem ser incluídas na base de cálculo do ICMS, porém, ao mesmo tempo, afirmar que só terão direito ao ressarcimento àqueles consumidores que, naquela data, já tiverem decisão favorável, ou que já questionaram a questão em juízo, pois, desta forma, limitar-se-á os valores a serem restituídos aos consumidores.
Se a questão seguir neste sentido – que é provável – todos aqueles consumidores que ainda não judicializaram a questão, não mais poderão fazê-lo.
Marcelo Barretto Ferreira da Silva Filho