O PACTO DE INDIVISÃO DE IMÓVEIS EM COPROPRIEDADE.

Introdução

 

O Código Civil [art. 1.320, § 1º] estabelece a possibilidade de se instituir pacto de indivisão, pelo qual os condôminos podem acordar que fique indivisa a coisa comum, por prazo não superior a cinco anos, suscetível, porém, de posterior prorrogação por novo pacto.

 

O pacto, ainda pode prever que seus efeitos são extensíveis a herdeiros e sucessores; o que é de grande utilidade considerando a possibilidade de um dos coproprietários falecer ou até de “perder” sua cota parte no imóvel para um credor[1].

 

O Código ainda estabelece a possibilidade [§2º do art. 1.320] de doador ou testador estabelecer tal restrição.

 

Para compreender melhor o instituto é necessário esclarecer que se um bem tem vários proprietários, cada um deles é um “condômino” e detém uma fração ideal do imóvel, sendo que isso não significa que cada um exercerá seu direito de propriedade circunscrito a referida fração. O objeto do direito de propriedade de cada condômino é a integralidade do bem[2], porém, a fração ideal será a proporção segundo a qual o condômino participará das vantagens ou lucros e dos encargos ou despesas da coisa comum.

 

Por outro lado, existem bens que por sua natureza são divisíveis e outros que não. Não obstante tal dualidade, tanto no condomínio de bem divisível como no de bem indivisível, qualquer coproprietário poderá requerer a dissolução do condomínio, a qualquer momento.

 

Tal direito potestativo decorre do caráter de exclusividade do direito de propriedade. A copropriedade pode criar embaraços sérios e indesejáveis, já que a concorrência de diversos donos sobre o mesmo bem altera o caráter regular do direito de propriedade: sua exclusividade sobre a coisa[3].

 

Assim, o condomínio é sempre provisório e a situação de indivisão transitória, motivo pelo qual o Código Civil estabeleceu ser ao condômino, a todo tempo lícito, exigir a divisão da coisa comum.

 

Caso o imóvel seja divisível e todos os coproprietários maiores, capazes e concordes, a divisão amigável poderá ser realizada através de escritura pública [art. 571, CPC]. Caso algum destes requisitos esteja ausente e um dos coproprietários deseje a extinção do condomínio, deverá distribuir ação de divisão de terras particulares.

 

Quando o imóvel for indivisível e um dos coproprietários desejar o fim do condomínio, poderá se acordar pela compra do quinhão ideal daquele retirante pelos demais, porém quando tal situação não for possível, o bem deverá ser vendido, sendo o valor apurado repartido de acordo com a fração ideal de cada coproprietário.

 

Sendo ainda o bem indivisível e levado à venda, seja forçada [através de ação judicial] ou consensualmente haverá direito de preferência aos condôminos em relação aos terceiros ofertantes, e se a disputa ocorrer entre coproprietários, terá preferência aquele que tiver no imóvel benfeitorias mais valiosas, e, não as havendo, o de quinhão maior.

 

Assim e compreendido o direito potestativo de qualquer dos coproprietários em requerer a extinção do condomínio, a utilidade do pacto de indivisão.

 

Utilidade Prática

 

Imagine-se que alguns irmãos herdam uma fazenda e que ela necessite de significativo investimento para que se torne produtiva [despesas com correção do solo, compra de maquinário e equipamentos, reforma e implantação de instalações como silos e galpões]. Imaginemos, ainda que os herdeiros se reúnam e com se cotizem para adquirir todos os insumos e serviços necessários para tanto e iniciem o planejamento para que em quatro anos possam ter resultado financeiro deste investimento com duas colheitas e venda da safra.

 

Qual será o impacto, se transcorridos os 12 meses e estando próximo do início do primeiro plantio, um dos coproprietários manifeste desejo de vender sua cota parte da fazenda ou caso nenhum dos irmãos tenha interesse em adquiri-la, pleiteie a divisão da área, para que possa vender a um terceiro?

 

É possível que a questão tenha contornos de maior complexidade se houver necessidade de divisão do imóvel rural, considerando área agricultável, localização da reserva legal, áreas de preservação permanente, bem como as edificações construídas dentro da propriedade e que são necessárias para a execução da atividade agrícola.

 

O pacto de indivisão é ferramenta útil para evitar tal cenário [pelo menos pelo período de cinco anos] ao trazer a segurança para realização de determinado investimento e afastar receio de que algum dos coproprietários pretenda requerer a extinção do condomínio, antes que ocorra o retorno planejado.

 

Requisitos

 

Para que o pacto de indivisão seja válido ele deve ser realizado por unanimidade, sendo vedado pacto de indivisão parcial[4]. Além do requisito da unanimidade, o pacto deve ter prazo máximo de vigência de cinco anos. No caso de o pacto ter prazo superior, o excedente será nulo. Nada impede, porém, posteriores prorrogações por novos pactos, desde que, também, limitados a cinco anos.

 

Se o imóvel objeto do pacto tiver valor superior a 30 salários-mínimos é necessário que a convenção seja formalizada através de escritura pública, para que tenha validade[5]. Além da forma de sua celebração, importante mencionar que a Lei de Registros Públicos [Lei 6.015/1973] prevê em seu art. 167, I, que convenções de condomínio serão registradas perante a matrícula do imóvel. Tal registro é necessário, para que a convenção tenha efeitos “erga omnes” e vinculem terceiros, inclusive eventuais credores de um dos coproprietários do imóvel.

 

Assim e estando o pacto de indivisão [com cláusula de extensão de efeitos à herdeiros e sucessores] registrado perante a matrícula imobiliária, no caso de um credor adjudicar quinhão de um dos coproprietários, estará o novo proprietário vinculado ao pacto, e, portanto, obrigado a permanecer vinculado ao estado de indivisão.

 

Exceções

 

Cabe apontar que apesar do vínculo criado pelo pacto de indivisão, tal estado pode ser desfeito se comprovadas graves razões [art. 1.320, §3º, CC], o que segundo a doutrina seria o caso de disputas entre os coproprietários que colocassem em risco a integridade do imóvel, sua função social ou que implicasse na desvalorização do bem, caso permaneça o estado de indivisão até o final do prazo previsto no pacto.

 

Outra situação que permitiria a não observância do pacto, seria de o credor comprovar consilium fraudis entre os condôminos, que ao onerarem o imóvel com tal restrição, estivessem visando frustrar a satisfação do crédito[6].

 

Conclusão

 

O pacto de indivisão é instrumento útil, pelo qual é possível pactuar não somente período de indivisão, mas condições para que a indivisão permaneça [ex. que seja realizado investimento por todos no bem comum, dentro de cronograma acordado]; como também hipóteses para extinção do condomínio e como ela se procederá.

 

 

Rodrigo Elian Sanchez

 

[1] Necessário destacar que o atual Código Civil em seu art. 1.420, §2º permite o gravame de parte ideal independentemente da autorização dos demais coproprietários, mesmo se tratando de imóvel indivisível.

[2] Nas palavras de Silvio Rodrigues: “A noção de condomínio contrasta, de um certo modo, com a afirmação anteriormente feita, de exclusividade do direito de propriedade. E para conciliar a aparente contradição, entende-se que o direito de propriedade é um só, do qual cada um dos coproprietários tem uma parte ideal. RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. v. 5 – Direito das Coisas, 25ª ed., São Paulo, Saraiva, 2000, 189.

[3] SARAIVA, Bruno de Sousa. Notas sobre o pacto de indivisão (art. 1.320, § 1º, do Código civil brasileiro de 2002). Revista de Direito Civil Contemporâneo, v. 38, p. 109-144, São Paulo, Ed. RT, 2024, p. 124.

[4] SARAIVA, Bruno de Sousa. Ob. Cit. p. 134.

[5] O Código Civil em contêm regra a respeito em seu art. 108, que transcrevemos: “Não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário-mínimo vigente no País”.

[6] SARAIVA, Bruno de Sousa. Ob. Cit. p. 139.