Noções gerais sobre testamento

Quem pode testar, o quê, e por quê:

 

No Brasil, toda pessoa capaz pode dispor, por testamento, da totalidade dos seus bens, ou de parte deles, para depois de sua morte, ressalvada a legítima dos herdeiros necessários, que não poderá ser incluída no testamento.

 

Em outras palavras, toda pessoa capaz pode dispor de metade (50%) de seu patrimônio, tendo respeitada sua vontade pessoal. A outra metade (50%) obrigatoriamente deve ser transmitida aos herdeiros necessários, ou seja, aos descendentes, ascendentes, e cônjuge, observando-se as regras de sucessão, conforme cada caso. Na falta de herdeiros necessários, a pessoa poderá dispor em testamento da totalidade de seus bens.

 

Portanto, lavrar um testamento se revela, na prática, uma forma de organização patrimonial, na medida em que facilita a organização e a administração do patrimônio, e garante que os bens sejam distribuídos de acordo com os desejos do testador e evitando possíveis conflitos entre herdeiros.

 

Outra vantagem de se lavrar um testamento, é a possibilidade de nomear herdeiros e legatários específicos, que não seriam beneficiados automaticamente pelas regras legais de sucessão (herdeiros necessários). Podemos aqui citar, como exemplo, parentes distantes, funcionários, ONG´s, fundações etc.

 

Além da organização e administração patrimonial, em alguns casos, a lavratura de um testamento permite a inclusão de cláusulas específicas, tais como as cláusulas restritivas à propriedade (inalienabilidade, impenhorabilidade e incomunicabilidade), bem como algumas condições para herdar e, até mesmo, a instituição de usufruto.

 

Sobre as testemunhas:

 

Uma dúvida que pode surgir ao testador quando decide lavrar um testamento, é sobre quem ele indicará como testemunha (por Lei, duas testemunhas precisam assinar o testamento público, ou três testemunhas o testamento particular), afinal, elas terão conhecimento das disposições testamentárias, que, não raras vezes, o testador gostaria de manter em sigilo.

 

A escolha de testemunhas, portanto, precisa ser feita com cautela. Em linhas gerais, a testemunha deve guardar algumas características, como, não ser pessoa com interesse direto na herança (como cônjuges, companheiros, ascendentes, descendentes e colaterais até o terceiro grau dos herdeiros ou legatários) e não ter envolvimento direto nos assuntos familiares ou patrimoniais do testador.

 

A experiência nos mostra que costumam ser indicados como testemunhas amigos de confiança, como, por exemplo, colegas de trabalho e profissionais de confiança do testador, dentre eles médicos, advogados e contadores.

 

Estes últimos, via de regra, são as pessoas mais recomendadas, na medida em que além de conhecerem o testador, também conhecem seu patrimônio e, por outro lado, não têm interesse na herança.

 

Se a situação alterar:

 

Além das facilidades e cautelas apontadas acima, cabe destacar que a lavratura de um novo testamento, revoga o anterior. Portanto, o testador pode – e deve – atualizar um testamento para refletir seus desejos sempre que ocorrerem mudanças relevantes em sua vida, tais como – mas não se limitando a – o nascimento de mais um filho, ou a morte, um divórcio, ou um novo casamento, a aquisição de determinado bem que tenha impacto patrimonial relevante etc.

 

Evitar problemas e surpresas:

 

É extremamente importante frisar, que a lavratura de um testamento deve ser feita com assistência legal, pois, não raras vezes, herdeiros preteridos ou até mesmo credores contestam judicialmente a sua validade.

 

Os casos mais comuns de contestação judicial, envolvem vícios que podem acarretar a nulidade, parcial ou total, de testamentos. Se o vício não compromete a validade do testamento, mas apenas o patrimônio testado, o judiciário entende correto manter a testamento, e apenas adequá-lo, o mais próximo possível à vontade do testador.

 

Porém, em casos mais graves, o judiciário anula o testamento. Os principais vícios que podem levar à nulidade de um testamento são: (i) incapacidade do testador; (ii) vícios de consentimento, ou seja, erro, dolo e coação; (iii) vícios formais, ou seja, falta de testemunhas nos casos em que a lei exige ou desrespeito às formalidades legais; (iv) disposições contrárias à Lei, ou seja, ofensas à Legítima (50% do patrimônio) e disposição sobre bens inalienáveis, ou seja, quando o testador dispõe sobre bens que, por lei, são inalienáveis.

 

Assinatura eletrônica:

 

Uma outra dúvida que também pode surgir, é sobre a possibilidade de assinaturas eletrônicas para a lavratura de testamentos. E a resposta é que, a maioria dos tabeliões, não aceitam.

 

O ponto é que, como visto acima, o Código Civil estabelece requisitos específicos para a validade dos testamentos, que incluem a forma e a presença física do testador e das testemunhas.

 

Ao conversar com tabeliões e questioná-los sobre o motivo da não aceitação, o esclarecimento é o seguinte: a assinatura eletrônica pode implicar em risco de futura contestação, por falta de previsão legal específica sobre o tema, que cria insegurança jurídica para um ato que exige diversas formalidades, bem como pela facilidade com que a autenticidade da assinatura pode ser questionada judicialmente, com mais frequência do que o documento físico que é assinado na presença do notário. Além disso, a assinatura eletrônica, facilitaria casos de coação, na medida em que o testador poderia estar sob ameaça de alguém (que não esteja aparecendo na câmera da videoconferência), sem que seja possível ao notário verificar tal situação.

 

Conclusão:

 

Em suma, a decisão de lavrar um testamento deve considerar tanto os benefícios quanto as possíveis complicações e custos envolvidos (tanto de taxas e emolumentos, quanto de assessoria jurídica), sendo recomendado seguir rigorosamente os procedimentos estabelecidos pela legislação em vigor, e manter o testamento atualizado, para com isso garantir a sua validade e eficácia. Nesse sentido, o auxílio de um advogado é um importante fator de segurança no momento de lavrar o testamento.

 

 

Marcelo Barretto Ferreira da Silva Filho