BOLETIM INFORMATIVO – MARÇO 2023
BoletimBoletim RES, Advogados
Março de 2023
Prezados Srs., neste boletim trazemos artigos nas áreas do direito: processual civil, empresarial, sucessório e trabalhista.
No campo do direito processual civil, abordamos como o financiamento profissional de litígios pode servir de incentivo ao cumprimento dos contratos e das leis.
No espaço reservado para o direito empresarial, tratamos sobre o entendimento do STJ e jurisprudência acerca da apuração de haveres na dissolução parcial da sociedade.
Na área do direito sucessório, analisamos a possibilidade de realização de inventário e partilha extrajudicial quando há testamento e a participação de menores ou incapazes.
Por fim e no campo do direito trabalhista, versamos sobre como a utilização inadequada de informações de terceiros pode caracterizar falta grave de empregado.
Lembramos que em nosso site, você pode sempre encontrar notícias atualizadas; uma boa leitura!
BOLETIM INFORMATIVO – DEZEMBRO 2022
BoletimBoletim RES, Advogados
Dezembro de 2022
Prezados Srs., neste boletim trazemos artigos nas áreas do direito: imobiliário, processo civil, trabalhista e empresarial.
No campo do direito do imobiliário, abordamos os avanços e a desjudicialização dos compromissos de compra e venda de imóveis, com base no novo artigo 251-A da Lei de Registros Públicos.
No espaço reservado para o direito processual civil, tratamos sobre a possibilidade de estabelecer convenções processuais nos contratos para buscar um processo mais ágil e efetivo em casos de litígios.
Na área do direito trabalhista, analisamos a obrigatoriedade das cotas de empregados com deficiência e aprendizes nos quadros de empregados das empresas.
Abordamos também a legitimidade dos dependentes para propor ação trabalhista pelo falecido.
Por fim e no campo do direito empresarial, versamos sobre as vantagens da sociedade em conta de participação na estruturação de empreendimentos imobiliários.
Lembramos que em nosso site, você pode sempre encontrar notícias atualizadas; uma boa leitura!
Índice:
Direito Imobiliário:
Compromisso de compra e venda de imóveis: avanços e desjudicialização.
Fls………………………………………………………………………………………………………….05-08
– Rodrigo Elian Sanchez
Direito Processual Civil:
O artigo 190 do CPC/2015 – A possibilidade de estabelecer convenções processuais nos contratos.
Fls………………………………………………………………………………………………………….09-14
– Marcelo Barretto Ferreira da Silva Filho
Direito Trabalhista:
Cotas de empregados com deficiência e aprendizes nos quadros de empregados das empresas.
Fls………………………………………………………………………………………………………….15-17
– Eduardo Galvão Prado
A legitimidade de dependentes para propor ação trabalhista pelo falecido.
Fls………………………………………………………………………………………………………….18-23
– Aline Hitomi Kawakami Yamaguchi e Laura Mesquita Muniz
Direito Empresarial:
As vantagens da sociedade em conta de participação (“SCP”) na estruturação de empreendimentos.
Fls…………………..……………………………………………………………………………………..24-30
– Flavia de Faria Horta Pluchino
Compromisso de Compra e Venda de Imóveis: Avanços e Desjudicialização.
Ainda em 2015, a Lei nº 13.097 alterou a redação do Decreto Lei 745/69, e permitiu a rescisão do compromisso de compra e venda, sem a necessidade de ingressar com ação judicial, no caso de o contrato conter cláusula resolutiva expressa e tendo o promissário comprador não pago as parcelas em aberto, após ter sido notificado para fazê-lo em 15 dias. Foi passo tímido, porém significativo, no caminho da desjudicialização.
A Lei 13.097 de 2015, porém nada falava em relação ao cancelamento do registro, no caso de o compromisso ter sido registrado perante a matrícula do imóvel, o que tornava a questão nebulosa, pois, apesar do contrato poder ser rescindido sem a necessidade da intervenção judicial, o oficial de registro de imóveis não tinha base legal para proceder administrativamente ao cancelamento do registro, sem a anuência do promitente vendedor.
É importante lembrarmos, que o registro do compromisso de compra e venda perante a matrícula imobiliária é medida muito salutar, pois concede segurança ao adquirente [promissário comprador], em especial por dar publicidade a promessa de venda, conceder ao compromisso o status de direito real e em especial, evitar discussões em relação à fraude à execução, caso ocorram penhoras ou constrições posteriores a assinatura do compromisso, que venham a onerar o imóvel prometido à venda.
A Lei nº 14.382, de 2022, resolveu tal impasse, ao introduzir o art. 251-A na Lei de Registros Públicos. Assim como já acontecia na rescisão extrajudicial do compromisso de compra e venda no âmbito dos loteamentos de imóveis urbanos [artigo 32, parágrafo 1º da Lei 6.766/1979], o artigo 251-A da Lei dos Registros Públicos passou a admitir a rescisão do contrato registrado, sem a necessidade de recorrer ao Poder Judiciário, não apenas nos casos de loteamentos, mas em todos os casos de promessa de venda de imóveis cujas prestações não tenham sido pagas pelo promissário comprador.
Segundo a nova regra, em caso do atraso no pagamento de uma das parcelas do preço, a requerimento do promitente vendedor, o promitente comprador será intimado pessoalmente pelo oficial do competente registro de imóveis para satisfazer, no prazo de 30 (trinta) dias, a prestação ou as prestações vencidas e as que vencerem até a data de pagamento, os juros convencionais, a correção monetária, as penalidades e os demais encargos contratuais, despesas de cobrança e de intimação.
A mora poderá ser purgada mediante pagamento ao oficial do registro de imóveis, que dará quitação e no prazo de 3 (três) dias e depositará esse valor na conta bancária informada pelo promitente vendedor. Caso não ocorra a quitação integral dos débitos, o oficial de registro de imóvel certificará o ocorrido e intimará o promitente vendedor a promover o recolhimento dos emolumentos para efetuar o cancelamento do registro.
O objetivo é agilizar eventual recebimento pelo promitente vendedor de prestações devidas e no caso de não pagamento do valor em aberto, permitir o cancelamento do registro, para que o promitente vendedor possa realizar nova venda do imóvel.
Obviamente, que ainda existirão situações em que a intervenção judicial será indispensável, especialmente nos casos em que o promissário comprador já está na posse do imóvel, sendo necessária a sua retomada, porém, o procedimento será “sumarizado”, pois segundo o §6ª da nova regra, a certidão do cancelamento do registro do compromisso de compra e venda reputa-se como prova determinante para concessão da medida liminar de reintegração de posse.
É de se destacar, que será fundamental a forma com que as Corregedorias dos Tribunais de Justiça estaduais irão normatizar algumas questões de ordem jurídica e operacional dentro das suas respectivas competências, para viabilizar o avanço trazido pelo novo art. 251-A da Lei de Registros Públicos.
Em resumo, as alterações legislativas trazidas trarão grandes benefícios para o mercado imobiliário, especialmente no que se refere a simplificação de cancelamento de registros e retomadas de imóveis, conferindo uma maior segurança jurídica aos contratantes.
Rodrigo Elian Sanchez
O artigo 190 do CPC/2015 – A Possibilidade de Estabelecer Convenções Processuais nos Contratos.
Em vigor desde 18/03/2016, o Código de Processo Civil tem em sua estrutura o estímulo às soluções de conflitos através da autocomposição.
E para fomentar a auto-composição, previu a possibilidade de as partes estabelecerem convenções processuais atípicas. Trata-se da cláusula geral de convencionalidade ou cláusula geral de negociação, positivada nos artigos 190 e 200 do Código:
“Art. 190. Versando o processo sobre direitos que admitam autocomposição, é lícito às partes plenamente capazes estipular mudanças no procedimento para ajustá-lo às especificidades da causa e convencionar sobre os seus ônus, poderes, faculdades e deveres processuais, antes ou durante o processo.
Parágrafo único. De ofício ou a requerimento, o juiz controlará a validade das convenções previstas neste artigo, recusando-lhes aplicação somente nos casos de nulidade ou de inserção abusiva em contrato de adesão ou em que alguma parte se encontre em manifesta situação de vulnerabilidade.
Art. 200. Os atos das partes consistentes em declarações unilaterais ou bilaterais de vontade produzem imediatamente a constituição, modificação ou extinção de direitos processuais.”
A ideia da cláusula geral de negociação é permitir que as partes possam arquitetar e desenhar, previamente, nos contratos em geral, as condições de um possível litígio com vistas a não só aumentar as chances de uma autocomposição, como também tentar prever e agilizar questões processuais – abreviando o tempo do processo e trazendo redução de custos – caso um acordo não seja viável, e o fórum seja a única saída.
Sobre a matéria, Humberto Theodoro Júnior ensina que “é evidente que a possibilidade de as partes convencionarem sobre ônus, deveres e faculdades deve limitar-se aos seus poderes processuais, sobre os quais têm disponibilidade, jamais podendo atingir aqueles conferidos ao juiz. Assim, não é dado às partes, por exemplo, vetar a iniciativa de prova do juiz, ou o controle dos pressupostos processuais e das condições da ação, e nem qualquer outra atribuição que envolva matéria de ordem pública inerente à função judicante”.
Verifica-se, portanto, que os prazos peremptórios são insuscetíveis de serem modificados previamente pela via contratual, havendo tal possibilidade apenas quando o litígio já estiver instaurado, de comum acordo entre o juiz e as partes, e em casos excepcionais, nos termos do artigo 191, § 1º do mesmo diploma legal:
“Art. 191. De comum acordo, o juiz e as partes podem fixar calendário para a prática dos atos processuais, quando for o caso.
§1º O calendário vincula as partes e o juiz, e os prazos nele previstos somente serão modificados em casos excepcionais, devidamente justificados.
§2º Dispensa-se a intimação das partes para a prática de ato processual ou a realização de audiência cujas datas tiverem sido designadas no calendário”.
Feitas as ressalvas acima, via de regra, as partes têm a liberdade para, pela via contratual, exercer a criatividade para dispor e obter benefícios mútuos em termos de convenção e negociar as condições de um possível litígio, no âmbito dos deveres processuais disponíveis.
Em relação à limitação da negociação processual, ensina Teresa Arruda Alvim Wambier (em Primeiros comentários ao Novo Código de Processo Civil. Artigo por artigo. São Paulo: RT, 2015, p. 356-357) que não é “possível a pactuação de negócio jurídico processual que tenha por objeto deveres processuais imperativamente impostos às partes, sob pena de ser-lhe ilícito o objeto. Não vigora, ipso facto, o ‘vale tudo’ processual. O negócio jurídico processual não tem, e nem deve ter, esta extensão. (…) Não se pode, é nossa convicção, dispor em negócio jurídico processual que uma decisão poderá ser não fundamentada, ou que não vigora o dever de cumprir as decisões judiciais. Admiti-lo seria algo comparável à admissão do objeto ilícito na celebração do negócio jurídico processual.”
A possibilidade de negociar questões processuais enfrenta resistência e dificuldade de aceitação, pois o modelo adotado pelos Códigos Processuais Brasileiros (de 1939 e 1973), era o de um processo inquisitivo, ou seja, o juiz era o protagonista e a marcha processual dependia dele para avançar.
O CPC vigente retirou esse protagonismo do Juiz, concedendo maior autonomia às partes, para, em processos que versem sobre direitos que admitam autocomposição, adequarem as soluções processuais à especificidade da causa e de seus interesses, utilizando a criatividade para prever soluções processuais que lhes beneficiem em casos de litígios, não somente no plano do direito processual, como também no plano do direito material.
Obviamente, há opiniões contrárias em relação à possibilidade das partes estabeleceram negócios jurídicos processuais. Em linhas gerais, elas entendem que a vontade das partes seria irrelevante, pois não teriam o poder de alterar os efeitos dos atos processuais. Nas palavras de Didier Junior: “A vontade das partes seria, então, irrelevante na determinação dos efeitos que os atos processuais produzem. Os efeitos dos atos processuais não seriam, em outras palavras, moldáveis. A única disponibilidade que as partes teriam seria a opção de praticar ou não o ato previsto numa sequência predeterminada pelo legislador. Qualquer que fosse a opção da parte, os efeitos dos atos processuais já estariam tabelados”. (DIDIER JÚNIOR, 2016, p. 50).
Não obstante entendimentos contrários, fato é que há, sim, na via contratual, espaço para efetiva aplicação da cláusula geral de negociação prevista no art. 190 do CPC/2015. As oportunidades são as mais diversas, e tem como principal incentivo, o interesse das partes em buscar uma situação de “ganha-ganha” que alterem, delimitem e/ou simplifiquem procedimentos no decorrer do processo judicial, sabidamente moroso.
Dentre os exemplos de ajustes pela via contratual que podem ser citados, estão: (i) a obrigação de uma perícia prévia para aferir a ocorrência ou não de ilícito contratual e sua extensão, bem como a contratação ou a dispensa consensual de assistente técnico; (ii) a obrigação de rateio de custas processuais entre as partes litigantes; (iii) a obrigação de uma sessão de mediação prévia, ou até mesmo uma rotina de sessões de mediação durante o curso do processo; (v) acordo para se estabelecer o julgamento antecipado da lide, desde que a matéria permita.
Em que pese o histórico de insegurança jurídica que temos no país, não se pode negar que a cláusula geral de negociação é um bom caminho, pois a solução da qual as partes efetivamente participem é melhor aceita por elas, o que minimiza a frustração e a demora na pacificação dos conflitos.
Assim, a cláusula geral de negociação segue a esteira de técnicas que já são amplamente utilizadas em procedimentos arbitrais e está em harmonia com o dinamismo que a tecnologia atual imprimiu aos negócios jurídicos, exigindo que os contratos prevejam, sempre que possível, meios alternativos de tornar mais rápidos e econômicos os eventuais litígios.
Marcelo Barretto Ferreira da Silva Filho
Cotas de Empregados com Deficiência e Aprendizes nos Quadros de Empregados das Empresas.
O cumprimento de cotas de empregados com deficiência e de aprendizes é uma obrigação determinada por lei para certas empresas, de acordo com o número de empregados.
Cotas de Empregados com Deficiência
De acordo com a lei 8213/1991, as empresas com mais de 99 empregados devem preencher entre 2% e 5% de seu quadro de empregados, com pessoas portadoras de deficiência, na seguinte proporção: até 200 empregados, deve haver 2% de pessoas com deficiência; de 201 a 500 empregados, deve haver 3% de pessoas com deficiência; de 501 a 1000 empregados, deve haver 4% de pessoas com deficiência; e, acima de 1000 empregados, deve haver 5% de pessoas com deficiência.
A comprovação da deficiência é realizada através de laudo médico.
De acordo com Portaria Interministerial do Ministério do Trabalho e Previdência nº 12 de 17/01/2022, a partir de janeiro de 2022, a multa pelo descumprimento das cotas reservadas para empregados com deficiência é de R$ 2.926,52 a R$ 292.650,52, por vagas não preenchidas, de acordo com critérios como reincidência na infração, faturamento entre outros. O valor da multa é atualizado anualmente.
Cotas de Aprendizes
De acordo com o artigo 429 da Consolidação das Leis do Trabalho, com exceção das microempresas e empresas de pequeno porte, que estão dispensadas do cumprimento das cotas de aprendizes, os estabelecimentos de qualquer natureza devem empregar entre 5% e 15% de aprendizes do total de seus empregados, cujas funções demandem formação profissional.
O contrato de aprendizagem deve ser registrado em CTPS e, após recente alteração pelo Decreto 11.061/2022, pode ser realizado, em regra, por até três anos, com pessoas maiores de 14 anos e menores de 24 anos, inscritos em programas de aprendizagem técnico-profissional, orientado por entidade qualificada.
Caso o aprendiz seja contrato com idade entre quatorze e quinze anos incompletos, o contrato pode ser de até quatro anos.
De acordo com o artigo 434 da CLT, a multa pelo descumprimento das cotas reservadas para aprendizes é de um salário-mínimo regional por vaga não preenchidas. No caso de mais de uma vaga não preenchida, o somatório das multas não pode ultrapassar cinco salários-mínimos, salvo em caso de reincidência, em que esse somatório pode ser elevado ao dobro.
Tanto no cálculo de cotas destinadas para empregados com deficiência, como de aprendizes, se a aplicação da porcentagem resultar em número fracionado, a empresa deve arredondar para cima.
A demissão de um empregado cotista, pode ocorrer apenas após a contratação de outro, para preenchimento da cota.
Muitas vezes, as empresas não conseguem contratar esses empregados, por falta de oferta. Nesses casos, há decisões judiciais que deixam de aplicar a multa pelo descumprimento de cotas, após ficar provado que a empresa empreendeu esforços para realizar as contratações, porém, não obteve êxito por falta de candidatos.
Portanto, para evitar a aplicação das penalidades, é importante que as empresas procurem se adequar, para cumprirem as cotas de empregados com deficiência e aprendizes, e registrem de forma documental as tentativas de recrutamentos e contratações.
Eduardo Galvão Prado
A Legitimidade de Dependentes para Propor Ação Trabalhista pelo Falecido.
A lei determina que quem tem legitimidade para propor ação trabalhista é o próprio empregado, em razão do caráter intuitu personae[1] da relação de trabalho, sendo que a morte deste último é considerada umas das causas extintivas do contrato individual de trabalho, o que tornaria impossível, portanto, a continuidade de sua execução.
Em outras palavras, no caso de falecimento do empregado, a rescisão do contrato de trabalho é automática, já que um dos requisitos que caracterizam essa relação, qual seja, o da pessoalidade, previsto no artigo 3º da CLT, deixa de existir.
Contudo, tal regra é relativizada, pelo art. 1º, da Lei 6.858/80, que autoriza os dependentes a receberem as verbas trabalhistas que seriam devidas ao falecido. Confira-se o enunciando da norma:
“Art. 1º – Os valores devidos pelos empregadores aos empregados e os montantes das contas individuais do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço e do Fundo de Participação PIS-PASEP, não recebidos em vida pelos respectivos titulares, serão pagos, em quotas iguais, aos dependentes habilitados perante a Previdência Social ou na forma da legislação específica dos servidores civis e militares, e, na sua falta, aos sucessores previstos na lei civil, indicados em alvará judicial, independentemente de inventário ou arrolamento.”
Logo, de acordo com a norma supracitada, em caso de falecimento do empregado, os créditos trabalhistas devem ser pagos em quotas iguais da seguinte forma: a) dependentes habilitados perante a Previdência Social ou na forma da legislação específica dos servidores civis e militares; e b) na sua falta, aos sucessores previstos na lei civil.
Ou seja, não havendo dependentes do empregado que estejam devidamente habilitados perante a Previdência Social ou na forma da lei dos servidores civis e militares, o artigo 1.829 do Código Civil será imediatamente aplicado[2].
A vigência posterior do Código Civil de 2002, lei geral, esta não implicou na revogação da Lei nº 6.858/80, que é lei especial, posto que o Código Civil nada considerou a respeito dos requisitos para sucessão de empregado falecido, matéria disposta apenas nesta última.
A jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho é uníssona ao estabelecer a legitimidade de dependentes para propor ação trabalhista pelo falecido, in verbis:
“RECURSO DE REVISTA DO RECLAMADO. 1. ILEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM. HERDEIRO. Esta Corte Superior ao interpretar o artigo 1º da Lei nº 6.858/80, tem entendido que os dependentes habilitados perante a Previdência Social e os sucessores previstos na lei civil tem legitimidade para pleitear os direitos do titular não recebidos em vida decorrentes da relação empregatícia, independentemente de inventário ou arrolamento, sendo que a falta de habilitação dos herdeiros perante a previdência social, por si só, não autoriza a extinção do processo sem julgamento do mérito, na medida em que a habilitação pode ser feita até mesmo quando da liquidação da sentença. Precedentes. (TST – RR- 13200-66.2009.5.06.0002, Relator Ministro Guilherme Augusto Caputo Bastos, 2ª Turma, DEJT 25.5.2012)”.
“RECURSO DE REVISTA DO RECLAMADO. ILEGITIMIDADE ATIVA. DIREITOS DECORRENTES DO CONTRATO DE TRABALHO. FILHOS DO EMPREGADO FALECIDO HABILITADOS PERANTE O INSS. O Tribunal Regional consignou que o autor é filho do “de cujus”, empregado do reclamado, e está regularmente habilitado junto ao INSS. O artigo 18, caput, do CPC prevê que somente o titular do direito pode pleitear em juízo a sua satisfação, salvo nos casos autorizados por lei. Por sua vez, o artigo 1º da Lei 6.858/80 trata exatamente da referida exceção prevista no artigo 18, caput, do CPC, para os créditos trabalhistas de empregado falecido. O referido disposto prevê que os dependentes habilitados perante o INSS podem pleitear judicialmente direitos trabalhistas devidos ao empregado falecido. Precedentes. (RR-112800-90.2010.5.17.0011, 3ª Turma, Relator Ministro Alexandre de Souza Agra Belmonte, DEJT 26/05/2017)”.
Mas afinal, são todos os direitos trabalhistas que poderão ser pleiteados pelos dependentes?
E nos casos de acidente de trabalho que consequentemente gerou a morte do trabalhador, é possível postular na justiça do trabalho indenização por danos materiais ou danos morais?
A Emenda Constitucional nº 45, de 08.12.2004 acrescentou ao artigo 114 da Constituição Federal o inciso VI, que dispõe que a Justiça do Trabalho é competente para processar e julgar “as ações de indenização por dano moral ou patrimonial, decorrentes da relação de trabalho”.
Inclusive, o Tribunal Superior do Trabalho já firmou entendimento de que, o pedido de indenização por danos morais e materiais configura direito patrimonial transmissível por herança, nos termos do art. 943 do Código Civil e, por se tratar de uma indenização em razão do acidente que o de cujus sofreu durante o contrato de trabalho, os dependentes terão legitimidade ativa ad causam para pleitear a indenização por danos materiais na esfera trabalhista. Vejamos:
“ILEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM. INTERPOSIÇÃO DA AÇÃO PELO ESPÓLIO POSTULANDO INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS DECORRENTES DE ACIDENTE DO TRABALHO CUJO RESULTADO VITIMOU O TRABALHADOR. DIREITO PATRIMONIAL DO DE CUJUS TRANSMISSÍVEL POR HERANÇA. Discute-se, no tópico, a legitimidade do espólio para pleitear crédito derivado do contrato de trabalho, qual seja, indenização por danos morais e materiais decorrentes de acidente do trabalho cujo resultado vitimou o trabalhador. Ressalte-se que o espólio não pleiteia para si qualquer indenização decorrente do falecimento do trabalhador (direito próprio), mas sim em face do acidente que ele sofreu no curso do contrato de trabalho, indenização esta que o próprio empregado pleitearia caso o acidente lhe tivesse causado apenas incapacidade e não o evento morte. Assim, ante a leitura dos arts. 1.784, 943 e 12, parágrafo único, do Código Civil e na esteira da jurisprudência desta Corte, há que se concluir que o espólio tem legitimidade ativa ad causam, tendo em vista que o pedido de indenização por danos morais e materiais decorre do contrato de trabalho havido entre o empregador e o de cujus. Ora, o pedido de indenização por danos morais e materiais configura direito patrimonial transmissível por herança, nos termos do citado art. 943 do Código Civil. Para a hipótese dos autos, o espólio efetivamente postula a reparação por dano extrapatrimonial sofrido em vida pelo de cujus, razão pela qual é parte legítima para figurar no polo ativo da lide. Por essa razão, a decisão regional pela qual se manteve a legitimidade do espólio para propor a presente ação não merece reforma. Nesse cenário, não há que se falar em afronta aos arts. 12, V, do CPC de 1973 (art. 75, VII, do NCPC) e 12, parágrafo único, do Código Civil ou mesmo em divergência com os arestos transcritos, à luz do artigo 896, § 7º, da CLT e da Súmula 333 do TST. Recurso de revista não conhecido. (RR-19000-24.2010.5.21.0002, 3ª Turma, Relator Ministro Alexandre de Souza Agra Belmonte, DEJT 11/12/2017)”.
Portanto, conclui-se que os herdeiros possuem legitimidade para propor ação trabalhista decorrente do contrato de trabalho do empregado falecido, desde que devidamente habilitados perante a Previdência Social, ou, na falta destes, os herdeiros da ordem civil.
Aline Hitomi Kawakami Yamaguchi e Laura Mesquita Muniz
[1] Trata-se de contrato em que apenas uma determinada pessoa poderá cumprir o acordado, uma vez que foi celebrado em razão de suas características pessoais.
[2] O Código Civil dispõe em seu artigo 1.829 uma ordem de preferência acerca da sucessão legítima de forma geral, elencando primeiro os descendentes em concorrência com o cônjuge sobrevivente, em seguida os ascendentes em concorrência com o cônjuge sobrevivente, em terceiro o cônjuge sobrevivente, e por fim, os colaterais.
As Vantagens da Sociedade em Conta de Participação (“SCP”) na Estruturação de Empreendimentos Imobiliários.
Introdução
A incorporação imobiliária é conceituada no artigo 28 da Lei 4.591/64, como a “atividade exercida com o intuito de promover e realizar a construção, para alienação total ou parcial, de edificações ou conjunto de edificações compostas de unidades autônomas”.
Seu principal traço característico é a comercialização das futuras unidades do empreendimento, antes mesmo do início das obras e durante sua construção. É este aspecto que a distingue da pura construção de um edifício e da direta constituição de um condomínio.
Segundo Fábio de Oliveira Azevedo:
“Não existe incorporação em qualquer atividade construtiva. É preciso que a construção seja acompanhada do propósito específico de alienar unidades antes de concluídas as obras.”
O incorporador, portanto, é o operador do negócio, ou seja, quem coordena as atividades dos diversos agentes envolvidos na implantação do empreendimento, sendo a pessoa responsável por mobilizar os fatores necessários à consecução do empreendimento imobiliário e por entregar as unidades finalizadas aos consumidores. Ele é conceituado no artigo 29 da Lei 4.591/64.
O Código Civil, em seu artigo 966, consolidou em definitivo a natureza empresária da incorporação imobiliária, uma vez que o incorporador “exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou circulação de bens ou de serviços”.
O exercício da atividade econômica organizada com propósito lucrativo, depende da reunião de capital para fazer frente aos custos iniciais do negócio. Na incorporação imobiliária não é diferente.
Isto porque, apesar da maior parte do financiamento das obras advir da alienação das unidades autônomas a serem construídas, para que o incorporador possa iniciar a alienação das unidades futuras, a incorporação deve estar registrada perante o registro imobiliário, conforme preconiza o artigo 32 da Lei 4.591/64.
Desta forma, os custos iniciais do empreendimento, notadamente as despesas com a concepção do negócio, projeto arquitetônico, aquisição do terreno, licenciamentos junto aos órgãos competentes, manutenção de estrutura empresarial, emolumentos, dentre outros, deverão ser arcados antes mesmo do lançamento do empreendimento.
Diante do alto custo envolvido na obtenção de recursos diretamente junto às instituições financeiras, os empreendedores passaram a procurar alternativas para captar investimentos junto a investidores particulares, em troca de participação societária no negócio.
Dentre as diversas formas de captação de recursos diretamente junto aos investidores particulares, destaca-se a Sociedade em Conta de Participação, forma muito difundida no mercado imobiliário.
Vantagens da SCP na estruturação de empreendimentos imobiliários
Nos termos do artigo 991, do Código Civil, a sociedade em conta de participação (“SCP”) é aquela em que o objeto social é exercido unicamente pelo sócio ostensivo, em seu nome individual e sob sua própria e exclusiva responsabilidade, participando os demais dos resultados correspondentes.
Na sociedade em conta de participação, portanto, apenas o sócio ostensivo aparece perante terceiros, respondendo sozinho pelas obrigações sociais.
Trata-se de sociedade não personalizada, cuja constituição independe de qualquer formalidade, com exceção de sua inscrição perante o Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas do Ministério da Fazenda (IN RFB 1470/14) e não gera efeitos perante terceiro.
Na estruturação de empreendimentos imobiliários, o incorporador figura como sócio ostensivo, sendo responsável pelo desenvolvimento do negócio, ao passo que o investidor figura como sócio participante, responsável apenas por entregar os valores a que se comprometeu no contrato para permitir a consecução do objeto social.
Toda a relação entre o incorporador e os investidores é regulada no contrato de constituição, que somente produz efeitos perante eles. Por conta disso, a SCP tem a discrição como uma de suas principais vantagens.
Neste sentido, a SCP tanto permite ao sócio ostensivo não divulgar que trabalha com capital alheio, quanto ao sócio participante de não divulgar que participa de empresa especulativa ou que possui relação com determinada pessoa, como bem pontuam João Pedro Scalzilli e Luís Felipe Spinelli (SCALZILLI; SPINELLI, 2014, p. 33).
Além disso, em razão da ausência de personalidade jurídica, a SCP não se sujeita à desconsideração da personalidade jurídica, o que confere ao patrimônio pessoal do sócio participante proteção extra.
Segundo Victor Machado Schimidt (2019, p. 137), outra vantagem da SCP na estruturação de empreendimentos imobiliários reside na sua informalidade e simplicidade, que confere aos sócios ampla liberdade na definição de direitos e obrigações, o que permite a adequação das cláusulas e condições do contrato de constituição às particularidades do negócio.
No contrato social, portanto, os sócios podem dispor livremente sobre as formas de retirada da SCP e de sua extinção, sem a necessidade de observar as providências de dissolução e liquidação exigidas pela Lei.
Também podem definir com ampla liberdade a forma e a periodicidade da distribuição dos resultados, sem ficarem atreladas às regras previstas para os demais tipos societários.
Do ponto de vista do empreendedor, a SCP permite a captação de recursos a um custo menor e sem impactos significativos nas prerrogativas gerenciais do negócio, pois é dele, e somente dele, as decisões sobre a consecução do empreendimento.
Do ponto de vista do investidor, a vantagem reside justamente na possibilidade de participar dos lucros do empreendimento, sem ficar obrigado a participar de sua gestão ou de se expor aos riscos de insucesso do negócio.
Relativamente ao tratamento fiscal conferido à SCP, a vantagem está no fato de que a RFB equipara esta sociedade às pessoas jurídicas em geral, de modo que os resultados a serem distribuídos são isentos de IR e de CSLL.
Conclusão
As vantagens da SCP a colocam, portanto, como um tipo societário versátil, capaz de providenciar “uma rápida mobilização de recursos para a alocação em empreendimentos imobiliários, sem que isso onere demasiadamente os sócios, ou os prendam a laços societários mais duradouros ou difíceis de ser extintos” (SCALZILI; SPINELLI, 2014, p. 287) e isto explica sua ampla utilização no mercado imobiliário brasileiro.
Flavia de Faria Horta Pluchino
Bibliografia
SCHIMIDT, Victor Machado. Estruturação Societária de Empreendimentos Imobiliários: em face dos regimes jurídicos da incorporação imobiliária e do mercado de valores mobiliários. Dissertação (mestrado) – Universidade Federal de Santa Catarina, Centro de Ciências Jurídicas, Programa de Pós-graduação em Direito. Florianópolis, 2019.
SCALZILI, João Pedro; SPINELLI, Luís Felipe. Sociedade em conta de participação. São Paulo: Quartier Latin, 2014.
BRASIL. Código Civil. Disponível em <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm>. Acesso em 11/12/2022.
BRASL. Lei 4.951/64. Disponível em <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l4591.htm>. Acesso em 11/12/2022.
Todos os direitos reservados – Rodrigo Elian Sanchez Sociedade de Advogados S/S.
BOLETIM INFORMATIVO – SETEMBRO 2022
BoletimBoletim RES, Advogados
Setembro de 2022
Prezados Srs., neste boletim trazemos artigos nas áreas do direito: do consumidor, trabalhista, empresarial e imobiliário.
No campo do direito do consumidor, abordamos os direitos do consumidor, na aquisição de unidade imobiliária em incorporação.
Na área do direito trabalhista, analisamos cautelas necessárias na demissão de empregado portador de doenças graves, para evitar, que a demissão seja considerada discriminatória.
No espaço reservado para o direito empresarial, tratamos da responsabilidade do sócio retirante pelo passivo social na sociedade limitada.
Por fim e no campo do direito imobiliário, versamos sobre o novo procedimento de adjudicação compulsória extrajudicial.
Lembramos que em nosso site, você pode sempre encontrar notícias atualizadas; uma boa leitura!
Índice:
Direito do Consumidor:
Os direitos do consumidor na aquisição de unidade imobiliária em incorporação.
Fls………………………………………………………………………………………………………….04-12
– Marcelo Barretto Ferreira da Silva Filho
Direito Trabalhista:
Proteção ao empregado portador de HIV ou doenças graves na rescisão contratual.
Fls………………………………………………………………………………………………………….13-15
– Eduardo Galvão Prado
Direito Empresarial:
A responsabilidade do sócio retirante pelo passivo social na sociedade limitada
Fls………………………………………………………………………………………………………….16-22
– Flavia de Faria Horta Pluchino
Direito Imobiliário:
A adjudicação compulsória extrajudicial: dúvidas e reflexões em relação ao novo procedimento.
Fls…………………..……………………………………………………………………………………..23-29
– Rodrigo Elian Sanchez
Os Direitos do Consumidor na Aquisição de Unidade Imobiliária em Incorporação.
A compra de um imóvel na planta é, sem sombra de dúvidas, um bom negócio por contar com boas vantagens e facilidades em termos de financiamentos.
No que se refere à incorporação em si, a construção do empreendimento, a legislação de observância é tratada a Lei 4.591/1964 (“Lei de Incorporações Imobiliárias”), a Lei 6.766/1979 (“Lei de Parcelamento do Solo Urbano”) e, mais recentemente, pela Lei 13.786/2018 (“Lei do Distrato”), no que se refere ao compromisso de compra e venda de unidades.
Porém, no que se refere aos diretos e obrigações das partes vendedora e compradora, e a forma como devem se comportar nesta relação, a matéria é tratada pela Lei 8.078/990 (“Código de Defesa do Consumidor” ou “CDC”), sendo importante destacar, que ela se aplica tanto para aqueles que adquirem unidades para fins de moradia, quanto para aqueles que o fazem como investimento.
Excetua-se, apenas, os casos em que o comprador exerce profissionalmente a atividade de compra e venda de imóveis, quando então fica descaracterizada a relação de consumo, conforme jurisprudência pacífica do STJ:
“(…) Há relação de consumo na compra e venda entabulada para fins de investimento, desde que o comprador não exerça referida atividade de forma profissional”. (AgInt no REsp n. 1.973.751/SP, relator Ministro Moura Ribeiro, Terceira Turma, julgado em 15/8/2022, DJe de 17/8/2022.)
Pois bem. No Brasil, há uma enorme demanda de consumidores por imóveis na planta, sendo um mercado considerado extremamente atrativo. Por outro lado, historicamente, esse tipo de negócio, por mais de uma vez, foi severamente impactado por desistências em massa, decorrente de fatores externos (crises econômicas; instabilidades políticas etc.). Nas próprias justificativas da Lei do Distrato, consta que as desistências dos negócios envolvendo imóveis na planta, por parte do adquirente, era um verdadeiro tormento ao consumidor, em face da ausência de norma legal que regulamentasse a questão.
Antes dela, um número relevante de desistências era levado aos Tribunais pátrios que, convergia no sentido de ser possível a resolução do contrato, mas divergia sobre o percentual de retenção pelas incorporadoras a título de ressarcimento de custos (as decisões variavam de 10% a 25% do valor pago pelo consumidor e, em alguns casos, percentual até maior), o prazo de devolução, questões relativas à comissão de corretagem, e outros pontos.
Em boa hora, a Lei do Distrato tratou dos pontos mais nefrálgicos e deixou a relação entre as partes mais transparente e previsível ao estipular cláusulas obrigatórias para os modelos de contratos de compra e venda, deixando-os em harmonia com as regras previstas no CDC, bem como ao estabelecer limites para o percentual de retenção em casos de desistências.
Em relação às cláusulas obrigatórias nos contratos de compra e venda, que passaram a ser exigidas, a Lei do Distrato estabeleceu a inclusão do art. 35-A na Lei de Incorporações Imobiliárias, com o seguinte teor:
“Art. 35-A Os contratos de compra e venda, promessa de venda, cessão ou promessa de cessão de unidades autônomas integrantes de incorporação imobiliária serão iniciados por quadro-resumo, que deverá conter:
I – o preço total a ser pago pelo imóvel;
II – o valor da parcela do preço a ser tratada como entrada, a sua forma de pagamento, com destaque para o valor pago à vista, e os seus percentuais sobre o valor total do contrato;
III – o valor referente à corretagem, suas condições de pagamento e a identificação precisa de seu beneficiário;
IV – a forma de pagamento do preço, com indicação clara dos valores e vencimentos das parcelas;
V – os índices de correção monetária aplicáveis ao contrato e, quando houver pluralidade de índices, o período de aplicação de cada um;
VI – as consequências do desfazimento do contrato, seja por meio de distrato, seja por meio de resolução contratual motivada por inadimplemento de obrigação do adquirente ou do incorporador, com destaque negritado para as penalidades aplicáveis e para os prazos para devolução de valores ao adquirente;
VII – as taxas de juros eventualmente aplicadas, se mensais ou anuais, se nominais ou efetivas, o seu período de incidência e o sistema de amortização;
VIII – as informações acerca da possibilidade do exercício, por parte do adquirente do imóvel, do direito de arrependimento previsto no art. 49 da Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990 (Código de Defesa do Consumidor), em todos os contratos firmados em estandes de vendas e fora da sede do incorporador ou do estabelecimento comercial;
IX – o prazo para quitação das obrigações pelo adquirente após a obtenção do auto de conclusão da obra pelo incorporador;
X – as informações acerca dos ônus que recaiam sobre o imóvel, em especial quando o vinculem como garantia real do financiamento destinado à construção do investimento;
XI – o número do registro do memorial de incorporação, a matrícula do imóvel e a identificação do cartório de registro de imóveis competente;
XII – o termo final para obtenção do auto de conclusão da obra (habite-se) e os efeitos contratuais da intempestividade prevista no art. 43-A desta Lei.
Com relação à possibilidade de atraso na entrega da obra, a Lei do Distrato consignou expressamente o limite de 180 dias de atraso, e estabeleceu a inclusão do art. 43-A na Lei de Incorporação Imobiliária, com o seguinte teor:
“Art. 43-A. A entrega do imóvel em até 180 (cento e oitenta) dias corridos da data estipulada contratualmente como data prevista para conclusão do empreendimento, desde que expressamente pactuado, de forma clara e destacada, não dará causa à resolução do contrato por parte do adquirente nem ensejará o pagamento de qualquer penalidade pelo incorporador.
- 1º Se a entrega do imóvel ultrapassar o prazo estabelecido no caput deste artigo, desde que o adquirente não tenha dado causa ao atraso, poderá ser promovida por este a resolução do contrato, sem prejuízo da devolução da integralidade de todos os valores pagos e da multa estabelecida, em até 60 (sessenta) dias corridos contados da resolução, corrigidos nos termos do § 8º do art. 67-A desta Lei.
- 2º Na hipótese de a entrega do imóvel estender-se por prazo superior àquele previsto no caput deste artigo, e não se tratar de resolução do contrato, será devida ao adquirente adimplente, por ocasião da entrega da unidade, indenização de 1% (um por cento) do valor efetivamente pago à incorporadora, para cada mês de atraso, pro rata die, corrigido monetariamente conforme índice estipulado em contrato.
- 3º A multa prevista no § 2º deste artigo, referente a mora no cumprimento da obrigação, em hipótese alguma poderá ser cumulada com a multa estabelecida no § 1º deste artigo, que trata da inexecução total da obrigação.”
Com relação à possibilidade de desfazimento do contrato, por solicitação do adquirente, a Lei do Distrato estabeleceu importantes regras, tanto com relação ao percentual máximo de retenção e os prazos para devolução, como também relativas à comissão de corretagem, previstas no art. 67-A na Lei de Incorporação Imobiliária, com o seguinte teor:
“Art. 67-A. Em caso de desfazimento do contrato celebrado exclusivamente com o incorporador, mediante distrato ou resolução por inadimplemento absoluto de obrigação do adquirente, este fará jus à restituição das quantias que houver pago diretamente ao incorporador, atualizadas com base no índice contratualmente estabelecido para a correção monetária das parcelas do preço do imóvel, delas deduzidas, cumulativamente:
I – a integralidade da comissão de corretagem;
II – a pena convencional, que não poderá exceder a 25% (vinte e cinco por cento) da quantia paga.
- 1º Para exigir a pena convencional, não é necessário que o incorporador alegue prejuízo.
- 2º Em função do período em que teve disponibilizada a unidade imobiliária, responde ainda o adquirente, em caso de resolução ou de distrato, sem prejuízo do disposto no caput e no § 1º deste artigo, pelos seguintes valores:
I – quantias correspondentes aos impostos reais incidentes sobre o imóvel;
II – cotas de condomínio e contribuições devidas a associações de moradores;
III – valor correspondente à fruição do imóvel, equivalente à 0,5% (cinco décimos por cento) sobre o valor atualizado do contrato, pro rata die;
IV – demais encargos incidentes sobre o imóvel e despesas previstas no contrato.
- 3º Os débitos do adquirente correspondentes às deduções de que trata o § 2º deste artigo poderão ser pagos mediante compensação com a quantia a ser restituída.
- 4º Os descontos e as retenções de que trata este artigo, após o desfazimento do contrato, estão limitados aos valores efetivamente pagos pelo adquirente, salvo em relação às quantias relativas à fruição do imóvel.
- 5º Quando a incorporação estiver submetida ao regime do patrimônio de afetação, de que tratam os arts. 31-A a 31-F desta Lei, o incorporador restituirá os valores pagos pelo adquirente, deduzidos os valores descritos neste artigo e atualizados com base no índice contratualmente estabelecido para a correção monetária das parcelas do preço do imóvel, no prazo máximo de 30 (trinta) dias após o habite-se ou documento equivalente expedido pelo órgão público municipal competente, admitindo-se, nessa hipótese, que a pena referida no inciso II do caput deste artigo seja estabelecida até o limite de 50% (cinquenta por cento) da quantia paga.
Portanto, a partir da entrada em vigor da Lei do Distrato (28/12/2018), os contratos de compra e venda de imóvel na planta, ou loteamentos, obrigatoriamente devem conter as cláusulas previstas acima.
Indo além, as questões relativas ao desfazimento do negócio por culpa das Partes (seja por resilição, seja por inadimplemento), passaram a obedecer aos limites e formas nela previstos, encerrando-se uma insegurança jurídica que até então havia.
Marcelo Barretto Ferreira da Silva Filho
Proteção ao Empregado Portador de HIV ou Doenças Graves na Rescisão Contratual.
Os empregados portadores de HIV e outras doenças graves capazes de causar estigma ou preconceito, são protegidos contra demissões sem justa causa pela súmula 443 do TST, por serem presumidas como discriminatórias.
Não obstante o empregador ter o direito potestativo de demitir um empregado, de acordo com a súmula, “presume-se discriminatória a despedida de empregado” nessas condições.
Com isso, se a demissão sem justa causa do empregado portador de HIV ou doença grave capaz de causar estigma ou preconceito for questionada na justiça do trabalho, o empregador terá o ônus de provar que o motivo da demissão não foi discriminatório, o que muitas vezes é difícil e até impossível.
Não há dúvida que os empregados portadores de doenças devem ter um anteparo legal, porém, na prática a aplicação indiscriminada da súmula 443 do TST, gera uma contraposição de direitos.
Essa proteção, não pode ser confundida com estabilidade, porém, se o empregador deixar de comprovar judicialmente que o motivo da demissão sem justa causa não foi discriminação, o empregado terá direito a ser reintegrado ao emprego e aos salários, férias, 13º salários entre outras verbas, do período entre a demissão e a reintegração.
De acordo com decisões do Tribunal Superior do Trabalho e de Tribunais Regionais do Trabalho, podemos elencar alguns motivos que justificam a dispensa do empregado portador de HIV ou doença grave capaz de causar estigma ou preconceito e impedem a aplicação da súmula.
O desconhecimento da doença por parte do empregador até a data de notificação do aviso prévio, a comprovação de reestruturação da empresa, ou da necessidade de corte de empregados por motivos econômicos ou financeiros e obviamente quando comprovada a justa causa da demissão.
Por outro lado, em julgamento recente, o TST decidiu que uma única avaliação negativa do empregado com câncer, não justifica a demissão e ressaltou que seria normal o empregado doente ter uma variação de rendimento e em diversas decisões do Tribunal Superior do Trabalho e de Tribunais Regionais do Trabalho, a súmula 443 foi aplicada com fundamento na ausência de provas sobre os motivos para a rescisão contratual.
Portanto, para evitar uma condenação de reintegração pagamento de indenização, a demissão de empregados com HIV ou doenças capazes de gerar estigma ou preconceito devem ser realizadas de forma motivada ou com justa causa e principalmente, as empresas devem documentar os motivos.
Eduardo Galvão Prado
A Responsabilidade do Sócio Retirante pelo Passivo na Sociedade Limitada.
Dispõe o art. 1.052, do Código Civil:
“Na sociedade limitada, a responsabilidade de cada sócio é restrita ao valor de suas quotas, mas todos respondem solidariamente pela integralização do capital social.”
Em outras palavras, perante a sociedade, cada sócio encontra-se obrigado a integralizar as próprias quotas. Já perante terceiros, todos os sócios respondem solidariamente pela integralização de todo o capital.
A integralização do capital social corresponde à efetiva entrega do montante prometido pelo sócio à sociedade. Quando duas ou mais pessoas se reúnem para constituir uma sociedade limitada, eles se comprometem a investir um determinado valor, que irá compor o capital social da pessoa jurídica. Esta operação se denomina subscrever.
Ao subscrever o capital social, ou seja, prometer que irá conferir determinado valor à sociedade, o sócio cria para si a obrigação de efetivamente entregar à sociedade aquele valor, isto é, a integralizar o valor na sociedade.
Até que todo o valor prometido por cada sócio seja integralizado, a responsabilidade de todos eles perante terceiros é solidária e limitada ao montante que restar ser integralizado.
O dispositivo legal do art. 1.052, do Código Civil é o que justifica o enunciado do art. 1.058, da mesma Lei, que confere aos sócios o direito de excluir da sociedade o sócio que deixa de integralizar o capital subscrito (prometido) ou, ainda, tomar para si ou para terceiros a parcela do capital prometido não integralizado.
Isto porque o capital social representa uma garantia financeira mínima para os credores da sociedade. Logo, sua expressão econômica deve corresponder àquela informada no contrato social.
Uma vez, portanto, integralizado o capital social, os bens pessoais dos sócios não respondem pelas obrigações da sociedade. Somente nas seguintes hipóteses, previstas na Lei, os prejuízos decorrentes do desenvolvimento normal dos negócios podem ser opostos aos sócios. São elas:
(a) pelas dívidas fiscais, no caso de liquidação de sociedade de pessoas;
(b) pela parte que falta para a integralização do capital social;
(c) pela avaliação dos bens conferidos ao capital social, em caso de superavaliação e, quando os bens forem créditos detidos pelo sócio contra terceiro, pela solvência deste terceiro;
(d) quando o sócio praticar atos contrários à Lei ou ao contrato social, hipótese em que se dispensa a instauração do incidente de desconsideração da personalidade jurídica;
(e) nos casos de desconsideração da personalidade jurídica;
(f) no caso de recebimento de lucros fictícios ou de lucros ilícitos, que atingem apenas os sócios que receberam os valores; e
(g) no limite do patrimônio social transferido, na hipótese de a sociedade entrar em liquidação e reembolsar os sócios.
Não obstante a regra da limitação da responsabilidade do sócio da sociedade limitada à integralização do capital social, havia uma discussão quanto à responsabilidade do sócio retirante pelo passivo social existente no momento da retirada, em virtude do que determina o art. 1.032, do Código Civil.
A dúvida residia no fato de que, se, por força da Lei, no caso, do art. 1.032, do CC, o sócio se mantem responsável pelas obrigações sociais pelo período de até 2 (dois) anos após a sua saída, contado da data do registro do ato de retirada, ele ficaria, destarte, responsável pelo pagamento do passivo existente na data de sua saída da sociedade.
A controvérsia, contudo, foi resolvida, e hoje é consenso na doutrina e na jurisprudência que a responsabilidade prevista no art. 1.032, do Código Civil não é genérica pelo passivo social a descoberto. Ela se limita às obrigações legais que tinha como sócio, inerentes ao tipo societário da pessoa jurídica.
E como visto, na sociedade limitada, essas obrigações se circunscrevem à responsabilidade solidária pela integralização do capital social, aí compreendidos, também, a exata estimação de bens porventura conferidos ao capital social, a evicção dos bens que aportou ou a solvência dos créditos cedidos.
Desta forma, “Se o capital já houver sido integralizado, isto é, se todas as quotas estiverem inteiramente liberadas, nenhum quotista, como tal, poderá ser compelido a fazer qualquer prestação. Nada deve ele, nem à sociedade, nem aos credores dela, cuja garantia repousa exclusivamente sobre o patrimônio social.” [1]
A propósito, veja-se o entendimento do STJ, sobre o tema:
“RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA PROFERIDA CONTRA SOCIEDADE LIMITADA. 1. DISTRATO DA PESSOA JURÍDICA. EQUIPARAÇÃO À MORTE DA PESSOA NATURAL. SUCESSÃO DOS SÓCIOS. INTELIGÊNCIA DO ART. 43 DO CPC/1973. TEMPERAMENTOS CONFORME TIPO SOCIETÁRIO. 2. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. FORMA INADEQUADA. PROCEDIMENTO DE HABILITAÇÃO. INOBSERVÂNCIA. 3. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1. Debate-se a sucessão material e processual de parte, viabilizada por meio da desconsideração da pessoa jurídica, para responsabilizar os sócios e seu patrimônio pessoal por débito remanescente de titularidade de sociedade extinta pelo distrato. 2. A extinção da pessoa jurídica se equipara à morte da pessoa natural, prevista no art. 43 do CPC/1973 (art. 110 do CPC/2015), atraindo a sucessão material e processual com os temperamentos próprios do tipo societário e da gradação da responsabilidade pessoal dos sócios. 3. Em sociedades de responsabilidade limitada, após integralizado o capital social, os sócios não respondem com seu patrimônio pessoal pelas dívidas titularizadas pela sociedade, de modo que o deferimento da sucessão dependerá intrinsecamente da demonstração de existência de patrimônio líquido positivo e de sua efetiva distribuição entre seus sócios. 4. A demonstração da existência de fundamento jurídico para a sucessão da empresa extinta pelos seus sócios poderá ser objeto de controvérsia a ser apurada no procedimento de habilitação (art. 1.055 do CPC/1973 e 687 do CPC/2015), aplicável por analogia à extinção de empresas no curso de processo judicial. 5. A desconsideração da personalidade jurídica não é, portanto, via cabível para promover a inclusão dos sócios em demanda judicial, da qual a sociedade era parte legítima, sendo medida excepcional para os casos em que verificada a utilização abusiva da pessoa jurídica. 6. Recurso especial provido.” (STJ – 1.784.032/SP – Rel. Min. Marco Aurélio Belizze – j. 02/04/2019).
Recentemente, o E. TJSP, em decisão monocrática da Em. Des. Jane Franco Martins, ao julgar o agravo de instrumento nº 2155823-64.2022.8.26.0000, reafirmou o entendimento de que “em uma dissolução parcial de sociedade limitada, o sócio retirante não possui uma responsabilidade genérica pela eventual constatação de uma situação patrimonial deficitária, em virtude de sua mera participação social.”
Nem mesmo o contrato social pode determinar ao sócio retirante que pague à sociedade o montante equivalente ao que competiria a ele nos prejuízos. Segundo Luis Felipe Spinelli:
“primeiro, porque, na hipótese de exclusão do sócio, isso pode se transformar em mecanismo de chantagem; segundo, porque corresponde, na prática, à deturpação do regime da limitação da responsabilidade (criando-se algo semelhante a uma sociedade em nome coletivo); terceiro, porque, com já visto (item 1.2.23) é proibido no país a existência de prestações suplementares. Da mesma forma, não se pode imputar ao sócio excluído a responsabilidade pelo pagamento dos débitos sociais.” [2]
Logo, se ao se apurar os haveres do sócio retirante, seja porque foi excluído, seja por exercício do direito potestativo de retirada, verificar-se que o patrimônio líquido da sociedade é negativo, ou seja, que ela apresenta prejuízo, ele nada terá a receber, mas também, nada terá a pagar à sociedade.
Em outras palavras, o sócio da sociedade limitada perde, apenas e tão somente, o capital investido no negócio.
Flávia de Faria Horta Pluchino
Bibliografia
[1] BORGES, João Eunápio. Curso de Direito comercial e terrestre. Rio de Janeiro: Forense, 1697, p. 130.
[2] SPINELLI, Luis Felipe. Exclusão de sócio por falta grave na Sociedade Limitada. São Paulo: Quartier Latin, 2015, p. 504/505.
COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 12 ed. São Paulo: Saraiva, 2008.
BORBA, José Edwaldo Tavares. Direito Societário. 14 ed. São Paulo: Atlas, 2015.
SPINELLI, Luis Felipe. Exclusão de sócio por falta grave na Sociedade Limitada. São Paulo: Quartier Latin, 2015.
BORGES, João Eunápio. Curso de direito comercial e terrestre. Rio de Janeiro: Forense, 1967.
A Adjudicação Compulsória Extrajudicial: Dúvidas e Reflexões em Relação ao Novo Procedimento.
Em 28 de junho de 2022 entrou em vigor a Lei nº 14.382 que alterou dispositivos de diversos diplomas legais, dentre eles a lei dos registros públicos (n° 6.015/73).
No que se refere a lei de registros públicos, uma interessante alteração foi no sentido da desjudicialização, com a inclusão do art. 216 -B, pela qual, sem prejuízo da via jurisdicional, a adjudicação compulsória de imóvel poderá ser efetivada extrajudicialmente, perante o serviço de registro de imóveis da situação do imóvel.
O procedimento judicial e sua evolução
A adjudicação compulsória, através da via jurisdicional está prevista em nosso ordenamento jurídico há mais de 70 anos, através da redação dada ao artigo 22 do Decreto Lei n° 58/1937, pela Lei nº 649, de 1949 e, posteriormente, pela Lei nº 6.014, de 1973.
Em resumo, nos compromissos de compra e venda de imóveis celebrados em caráter irrevogável e irretratável, tendo sido quitado o preço, e tendo sido o compromisso averbado perante a matrícula do imóvel, o promitente comprador poderá exigir do promitente vendedor a outorga da escritura de compra e venda, e, se houver recusa, requerer ao juiz a adjudicação do imóvel, servindo a sentença de procedência, como título para a transferência da propriedade.
No correr do tempo, a jurisprudência afastou a exigência da prévia averbação do compromisso de compra e venda perante a matrícula imobiliária, para o exercício da ação de adjudicação compulsória, tendo tal entendimento sido cristalizado, em 2000, com a edição da súmula n° 239 pelo Superior Tribunal de Justiça (“O direito à adjudicação compulsória não se condiciona ao registro do compromisso de compra e venda no cartório de imóveis”).
Por outro lado, obstáculo comum nas ações de adjudicação compulsória é a impossibilidade do registro da sentença, no caso de não ser possível emitir certidão conjunta de débitos administrados pela Receita Federal (PGFN), do vendedor. De acordo com a regra contida no art. 47, I, “b”, da Lei 8.212/91 é necessária a exibição da CND do vendedor, para atos de venda de imóveis. Sua dispensa é restrita aos casos em que a alienante for empresa que tenha por atividade a comercialização de imóveis, e que o imóvel a ser alienado não integre seu ativo fixo.
Não obstante tal exigência, nos casos em que os registros de imóveis se recusam a registrar a sentença proferida em ação de adjudicação compulsória, por ausência de CND do vendedor, o judiciário tem dispensado sua apresentação (TJSP, Apelação Cível n° 9000003-22.2009.8.26.0441, Rel. Des. José Renato Nalini, DJ: 05/03/2013).
As razões para afastar tal exigência são tanto de direito material, já que o promitente comprador teria lesado seu lídimo direito à propriedade [garantia fundamental elevada à cláusula pétrea , art. 5°, XXII, CF/88], como de índole prática, pois ao se negar o registro, pela ausência da certidão negativa de tributos do vendedor, se forçaria o interessado a buscar – via ação de usucapião, modo originário de aquisição da propriedade -, o reconhecimento do seu direito real sobre a coisa, o quê além de criar embaraço para o adquirente, também traria nova e desnecessária movimentação da máquina judiciária.
Neste sentido e no Estado de São Paulo, a Corregedoria Geral de Justiça inseriu o item 60.2, no Capítulo XVI, das Normas de Serviço do Extrajudicial:
“60.2. Nada obstante o previsto nos arts. 47, I, b, da Lei n.º 8.212, de 24 de julho de 1991, e no art. 257, I, b, do Decreto n.º 3.048, de 6 de maio de 1999, e no art. 1.º do Decreto n.º 6.106, de 30 de abril de 2007, faculta-se aos Tabeliães de Notas, por ocasião da qualificação notarial, dispensar, nas situações tratadas nos dispositivos legais aludidos, a exibição das certidões negativas de débitos emitidas pelo INSS e pela Secretaria da Receita Federal do Brasil e da certidão conjunta negativa de débitos relativos aos tributos federais e à dívida ativa da União emitida pela Secretaria da Receita Federal do Brasil e pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, tendo em vista os precedentes do Conselho Superior da Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo no sentido de inexistir justificativa razoável para condicionar o registro de títulos à prévia comprovação da quitação de créditos tributários”
Do procedimento extrajudicial
Feitas tais considerações, voltemos para o novo art. 216-A da Lei de Registros Públicos. Em referida norma foram estabelecidos os requisitos para o procedimento extrajudicial. São eles, a apresentação dos seguintes documentos, perante o oficial do registro de imóveis:
I – instrumento de promessa de compra e venda ou de cessão ou de sucessão, quando for o caso;
II – prova do inadimplemento, caracterizado pela não celebração do título de transmissão da propriedade plena no prazo de 15 (quinze) dias, contado da entrega de notificação extrajudicial pelo oficial do registro de imóveis da situação do imóvel, que poderá delegar a diligência ao oficial do registro de títulos e documentos;
III – certidões dos distribuidores forenses da comarca da situação do imóvel e do domicílio do requerente que demonstrem a inexistência de litígio envolvendo o contrato de promessa de compra e venda do imóvel objeto da adjudicação;
IV – comprovante de pagamento do respectivo Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis (ITBI);
A redação da norma, em nosso sentir, poderia ser mais detalhista, especialmente no que se refere ao inciso primeiro, pois sabemos que não é qualquer compromisso de venda e compra que dá direito a adjudicação compulsória, mas apenas os que são celebrados sem possibilidade de arrependimento.
Por outro lado, é de se destacar que em seu texto original, constava o §2°, que foi vetado. Sua redação era a seguinte: “§ 2º O deferimento da adjudicação independe de prévio registro dos instrumentos de promessa de compra e venda ou de cessão e da comprovação da regularidade fiscal do promitente vendedor.”
Tal parágrafo, dispensava expressamente o prévio registro do instrumento de compra e venda perante a matrícula do imóvel, bem como a exibição da CND – Receita Federal do promitente vendedor.
Questão tormentosa será como os registradores e as corregedorias dos tribunais de justiça estaduais (que regulam o serviço notarial) irão interpretar referido veto. Tal ponderação é feita, em razão do veto poder ser interpretado como necessidade da observância de tais condições, o que tornaria o procedimento extrajudicial, de certo modo, mais tormentoso que o judicial.
Por outro lado, entendemos que do veto não se pode presumir a existência de tais requisitos, pois se não constou a dispensa, também não constou referidas exigências, na redação final do art. 216-B. Assim, insuscetível, de se exigir algo que a lei não previu, a teor do princípio da legalidade (art. 5°, II, CF/88: “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”).
É relevante destacar, que as mesmas razões que se aplicam para dispensar a CND da Receita Federal do promitente vendedor, no caso de o procedimento ser judicial, devem ser aplicados ao procedimento extrajudicial, já que inexiste elemento distintivo entre os procedimentos, que permita a aplicação de entendimento diverso, sob pena de se ferir o princípio da igualdade.
Feitas tais ponderações, vemos como muito bons olhos o novo instituto e especialmente a possibilidade de as partes resolverem seus conflitos fora da esfera judicial, desde que sejam juridicamente capazes. Evidente, que o novo instituto terá maior aderência à realidade social, caso a interpretação do art. 216-B da lei de registros públicos seja razoável e não enverede para imposição de obstáculos não previstos em lei; o que esperamos que se suceda.
Rodrigo Elian Sanchez
Todos os direitos reservados – Rodrigo Elian Sanchez Sociedade de Advogados S/S.
BOLETIM INFORMATIVO – JULHO 2022
BoletimBoletim RES, Advogados
Julho de 2022
Prezados Srs., neste boletim trazemos artigos nas áreas do direito: trabalhista, empresarial, processo civil e civil.
No campo do direito trabalhista, abordamos a impossibilidade de incluir empresa na fase de execução, sem que tenha participado da fase de conhecimento.
Na área de direito empresarial, analisamos recente decisão sobre a aplicação subsidiária das regras da sociedade simples, para afastar a limitação de responsabilidade dos sócios de sociedade limitada.
No espaço reservado para o direito processual civil, tratamos da natureza jurídica da sentença proferida na ação de despejo, se seria declaratória ou constitutiva negativa, e os efeitos na análise de operações imobiliárias.
Por fim, no campo do direito civil, versamos sobre o reconhecimento da aplicação da Convenção de Montreal para casos de indenização por danos materiais decorrentes de transporte aéreo internacional e inaplicabilidade no que se refere aos danos morais.
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Índice:
Direito Trabalhista:
Contornos sobre a possibilidade de incluir empresa na fase de execução, sem que tenha participado da fase de conhecimento.
Fls………………………………………………………………………………………………………….04-06
– Eduardo Galvão Prado
Direito Empresarial:
Impossibilidade de aplicação subsidiária das regras da sociedade simples para afastar a limitação de responsabilidade dos sócios de sociedade limitada.
Fls………………………………………………………………………………………………………….07-12
– Flavia de Faria Horta Pluchino
Direito Processual Civil:
O direito processual civil na extinção dos contratos de locação.
Fls………………………………………………………………………………………………………….13-18
– Rodrigo Elian Sanchez e Vitória Pedroso Silva
Direito Cível:
Transporte aéreo internacional: aplicação da Convenção de Montreal apenas para casos de indenização por danos materiais e por perda de bagagem, atrasos e cancelamentos de voo – inaplicabilidade em casos de indenização por danos morais.
Fls…………………..……………………………………………………………………………………..19-22
– Marcelo Barretto Ferreira da Silva Filho
Contornos sobre a Possibilidade de Incluir Empresa na fase de Execução sem que Tenha Participado da Fase de Conhecimento.
Na esfera trabalhista, a possibilidade de incluir empresa diretamente na fase de cumprimento de sentença, sem que tenha participado da fase de conhecimento, com fundamento em participação de grupo econômico, é discutida há bastante tempo e o entendimento dos tribunais ora é pela possibilidade, ora é pela impossibilidade.
A súmula 205 do TST estabelecia que empresa integrante de grupo econômico, que não participou da fase de conhecimento do processo, não poderia ser incluída na fase de execução.
A súmula, porém, foi cancelada em 2003 e a partir de então, os tribunais trabalhistas passaram a permitir a inclusão, entendimento que ficou pacificado, até recente decisão do STF.
Em agosto de 2021, em sede de recurso extraordinário, o Ministro Gilmar Mendes proferiu decisão que anulou acórdão proferido pelo TST, pelo qual havia admitido a inclusão de empresa na fase de cumprimento de sentença, sob o argumento de integrar grupo econômico com a executada.
Gilmar Mendes expôs o entendimento de que a inclusão de empresa diretamente na execução, sob fundamento de pertencer à grupo econômico de empresa devedora, viola as garantias constitucionais do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa.
Devemos destacar, que na esfera trabalhista, a parte incluída na fase de cumprimento de sentença, não é citada para se defender, mas para pagar no prazo de 48 horas a quantia determinada, podendo deduzir suas alegações de defesa apenas após garantir o juízo no valor total da execução ou nomear bens à penhora, o que representa enorme obstáculo ao exercício do contraditório.
Tendo em vista a relevância do tema e do entendimento exarado pelo STF recentemente e, ainda, a grande quantidade de recursos tratam deste tema, recentemente, em 23/05/2022, a vice-presidente do TST determinou a suspensão dos processos em fase de recurso extraordinário que tratem da ilegalidade da inclusão de empresa na fase de cumprimento de sentença sob o argumento de pertencer ao grupo econômico, e direcionou os recursos representativos desta controvérsia ao STF para julgamento de Recurso Extraordinário, já que as Turmas do STF têm entendimentos opostos sobre a questão. Para a 2ª Turma, “o cumprimento da sentença não poderá ser promovido contra aquele que não tiver participado da fase de conhecimento” (Rcl 49.974). Já a 1ª Turma, por sua vez, entendeu válido reconhecimento de responsabilidade solidária por empresa que compõe o mesmo grupo econômico (Rcl 51.753).
Caso o Supremo admita a controvérsia, a tese a ser definida quando do julgamento deste recurso extraordinário, será precedente vinculante para todos os órgãos do poder judiciário.
Eduardo Galvão Prado
A Impossibilidade da Aplicação Subsidiária das Regras da Sociedade Simples para Afastar a Limitação de Responsabilidade dos Sócios de Sociedade Limitada.
Recentemente, o TJSP, ao julgar o agravo de instrumento nº 2141291-22.2021.8.26.0000, deu provimento ao recurso, para incluir os sócios de sociedade limitada no polo passivo de ação executiva, de modo a responderem, com seus bens particulares pelas dívidas da sociedade. Transcrevemos a ementa:
“Execução – Pretendida pela agravante a inclusão dos sócios da agravada no polo passivo da demanda – Indícios veementes de desativação da sociedade devedora, com a sua consequente dissolução e liquidação irregular – Fato que afasta a responsabilidade limitada dos sócios, devendo eles responder ilimitadamente por todo o passivo pendente da sociedade – Responsabilidade subsidiária – Admissibilidade de afetação do patrimônio dos sócios da empresa executada – Art. 1.023, 1.024 e 1.080 do CC – Deferida a inclusão dos sócios da agravada no polo passivo da ação executiva – Agravo provido, mas por fundamentação diversa.” (TJSP, 23ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. José Marcos Marrone, v.u., data do julgamento 9 de fevereiro de 2022).
Na origem, tratou-se de ação de execução movida por uma sociedade limitada em desfavor de outra, para recebimento de dívida fundada em título executivo extrajudicial. Após o Juízo de 1ª instância indeferir o pedido de desconsideração da personalidade jurídica da devedora, para que seus sócios fossem incluídos no polo passivo da lide e respondessem com seus bens particulares pela dívida da sociedade, foi interposto perante o TJSP, recurso de agravo de instrumento.
Para a credora, o fato de os sócios da devedora possuírem várias empresas no mesmo ramo de atuação, com composições societárias idênticas, faria presumir o desvio de finalidade que autorizaria a instauração do incidente de desconsideração da personalidade jurídica.
No julgamento do recurso, apesar de reconhecer estarem ausentes o desvio de finalidade e a confusão patrimonial, a Turma Julgadora entendeu que a ausência de faturamento da devedora e de ativos capazes de fazer frente à dívida, representaria encerramento irregular da sociedade que, por si só, autorizaria a relativização da autonomia patrimonial da pessoa jurídica, por configurar responsabilidade subsidiária do sócio, por força dos arts. 1.023, 1.024 e 1.080, todos do Código Civil. Com base neste fundamento, deu provimento ao recurso.
Diante da decisão do TJSP, o presente artigo busca, sem pretensão de esgotar o tema, debater se caberia a aplicação subsidiária das normas da sociedade simples para afastar a limitação da responsabilidade dos sócios de sociedade limitada.
Segundo o dicionário Aulete Digital[1], subsidiário é aquilo que subsidia, auxilia. Para o direito, o princípio da subsidiariedade determina a aplicação residual de uma lei às hipóteses que não sejam objeto de regulação de outra norma e desde que sejam compatíveis.
A aplicação de uma norma subsidiariamente à outra dar-se-á, portanto, quando inexistir norma específica regulamentando determinada situação concreta. O próprio art. 1.053, do Código Civil, utilizado pelo Tribunal como fundamento do acórdão, é taxativo:
“Art. 1.053. A sociedade limitada rege-se, nas omissões deste Capítulo, pelas normas da sociedade simples”.
Ou seja, quando se observar lacunas ou omissões nas normas que regem situações concretas das sociedades limitadas, fica permitida a aplicação das normas da sociedade simples, nos casos em que elas sejam compatíveis com a natureza e os princípios da sociedade limitada.
Pois bem. No caso das sociedades limitadas, toda a matéria evolvendo a responsabilidade dos sócios possui regulação específica nos arts. 1.052, 1.055, §1º e 1.080, todos do Código Civil.
Em sua essência, a responsabilidade dos sócios neste tipo societário é restrita ao capital que cada um investiu na sociedade. Isto é assim, porque assim quis o legislador, como forma de estimular a atividade econômica, pois, na medida em que empreender é uma atividade de risco, ao predefinir o limite das perdas do empreendedor em caso de insucesso do negócio, há um encorajamento do exercício desta atividade, essencial para o desenvolvimento do país. Além disso, a redução dos riscos do empreendedor, permite a redução do custo e, consequentemente, dos preços dos produtos e serviços.
Sobre o tema, Fábio Ulhôa Coelho assim leciona:
“À limitação da responsabilidade dos sócios, na limitada, corresponde a regra jurídica de estímulo à exploração das atividades econômicas. (…) De fato, poucas pessoas – ou nenhuma – dedicar-se-iam a organizar novas empresas se o insucesso da iniciativa pudesse redundar a perda de todo o patrimônio, amealhado ao longo de anos de trabalho e investimento, de uma ou mais gerações. A limitação da responsabilidade do empreendedor ao montante investido na empresa é condição jurídica indispensável, na ordem capitalista, à disciplina da atividade de produção e circulação de bens ou serviços.” [2]
As exceções à regra da limitação da responsabilidade dos sócios na sociedade limitada também se encontram expressamente previstas na Lei adjetiva, no capítulo próprio das sociedades limitadas, a saber: até que o capital social esteja totalmente integralizado, a teor do que dispõe o art. 1.052; pela avaliação feitas pelos sócios dos bens com que o capital social foi integralizado, pelo prazo de 5 (cinco) anos; e nas deliberações sociais que infrinjam a Lei ou o contrato social, como determina o art. 1.080.
Nestes casos, a solidariedade dos sócios pelas obrigações sociais é automática, pois autorizada por disposição legal obrigatória.
Afora estas hipóteses, a única forma de transferir aos sócios a responsabilidade pelas dívidas e obrigações da sociedade, é através da desconsideração da personalidade jurídica, nos termos do art. 50, do código e observado o procedimento previsto nos arts. 133 a 137, do Código de Processo Civil.
Para tanto, caberá à parte que busca atingir os bens pessoais dos sócios demonstrar o abuso da personalidade jurídica, por desvio de finalidade ou por confusão patrimonial, em procedimento próprio para este fim, onde sejam assegurados a ampla defesa e o contraditório das partes envolvidas.
Assim, se as normas da sociedade limitada regulamentam integralmente a responsabilidade dos sócios neste tipo societário, inclusive quanto às exceções à regra da limitação ao valor do capital investido, não se verifica lacuna ou omissão na Lei que autorize a aplicação subsidiária das regras das sociedades simples a este tema específico.
Desta forma, resta equivocado o entendimento exarado no acórdão analisado, pois não poderia incluir os sócios da devedora no polo passivo da demanda executiva, com fundamento em reponsabilidade subsidiária prevista nos artigos 1.023 e 1.024 do Código Civil.
Por outro lado, é certo que a situação fática do caso concreto não se subsome à norma jurídica descrita pelo art. 1.080, do CC.
Isto porque, a ausência de ativos ou de faturamento não caracteriza deliberação contrária à Lei ou ao contrato social. Com efeito, a sociedade devedora nunca foi dissolvida, nem mesmo irregularmente, sendo certo que o mero insucesso do empreendimento não justifica a transferência das obrigações sociais aos sócios.
Flávia de Faria Horta Pluchino
O Direito Processual Civil na Extinção dos Contratos de Locação.
A lei de locações urbanas (Lei 8.245/91) é diploma legal complexo e que enfeixa tanto regras de direito material como de processual. No que se refere ao direito material, a lei de locações regula os direitos e obrigações dos locadores e locatários. No aspecto processual, determina o procedimento pelo qual o locador poderá retomar a posse do imóvel (ação de despejo), bem como regula a ação de consignação de aluguéis e, ainda, prevê a ação revisional e a ação renovatória, a primeira voltada a reajustar o valor da locação e a segunda voltada a proteger o ponto comercial, no caso da locação comercial.
Por outro lado, a lei de locações segue as regras gerais contidas no código civil no que se refere às hipóteses para o término da relação contratual. Tal extinção pode se dar de algumas formas, como por meio da rescisão contratual, da resolução contratual ou da resilição contratual.
Em breve síntese, a resolução é a extinção do vínculo contratual por fato não imputável ao devedor (e.g. força maior); já a rescisão é a extinção do vínculo contratual por falta imputável ao devedor, i.e., inadimplemento contratual; e, por fim a resilição é a extinção do contrato por vontade das partes, seja bilateral (distrato) ou unilateral (denúncia).
Nos contratos de locação, as formas mais comuns do término dos contratos são: a) rescisão contratual (i.e.: despejo por falta de pagamento), e, b) através de resilição, seja na modalidade bilateral (ou seja, quando há consenso para desfazer o contrato) ou unilateral.
Na locação comercial, a resilição pode ser sempre exercida, tanto pelo locador, como pelo locatário, mediante comunicado com trinta dias de antecedência, se o contrato estiver em vigência por prazo indeterminado. Já na locação residencial, a regra geral é que o locador apenas poderá denunciar o contrato, se a locação tiver sido formalizada por escrito, com prazo igual ou superior a trinta meses (artigo 46, da Lei de locações) e que referido contrato tenha entrado em vigência por prazo indeterminado.
No caso de o contrato estar em vigência por prazo determinado, a regra é que o locador não poderá reaver o imóvel antes do prazo final da locação (art. 4° da Lei de locações). Já o locatário, poderá denunciar a locação, mesmo estando em vigência por prazo determinado, pagando a multa, proporcional ao período de descumprimento do contrato. A exceção é o contrato built to suit em que o locatário não poderá denunciar a locação (art. 54-A da lei de locações urbanas).
Por outro lado, é importante destacar que a lei de locações contém regras cogentes, sendo diploma legal rígido, que não somente limita o exercício da autonomia da vontade das partes, com o intuito de proteger o locatário, como também, sanciona com pena de nulidade as cláusulas de contrato de locação que visem a elidir as garantias previstas em referido diploma legal; notadamente as que visem inviabilizar a prorrogação do contrato residencial por prazo indeterminado, ou que tenham como objetivo negar o direito à ação renovatória, no caso da locação comercial.
No que se refere ao procedimento para o locador retomar a posse do imóvel, destacamos que a lei de locações em seu art. 5° estabelece que: “seja qual for o fundamento do término da locação, a ação do locador para reaver o imóvel é a de despejo”.
Ao instituir a ação de despejo como o único meio (procedimento) para o locador retomar a posse do imóvel, o legislador desejou submeter ao escrutínio do poder judiciário a legalidade do fundamento alegado pelo locador para pôr fim ao contrato de locação.
Ademais, é evidente que o legislador desejou oportunizar ao locatário a possibilidade para demonstrar que sua permanência no imóvel é legitima e que o contrato de locação não poderia ser encerrado.
Neste sentido, e considerando que no caso de conflito entre locador e locatário, necessariamente o fim da relação locatícia será submetida ao exame judicial, a pesquisa da natureza da sentença proferida na ação de despejo é de extrema relevância, especialmente no que se refere as diligências e cuidados a serem dispensados nos negócios imobiliários, na medida em que o locatário ainda não despejado, poderia ou não remanescer na qualidade de locatário.
A questão que se coloca é se a natureza da sentença de despejo seria declaratória ou constitutiva negativa. No caso de ser declaratória, apenas reconhecerá que o contrato já teve seu término, em razão da ocorrência de uma das hipóteses previstas em lei para o encerramento do contrato de locação: i.e. denúncia vazia. A decisão meramente declaratória pressupõe uma situação de incerteza e tem por objetivo eliminá-la, por meio de uma certificação.
Por outro lado, se a sentença for constitutiva, o término da relação de locação apenas terá ocorrido com sua prolação. As sentenças constitutivas são aquelas que criam ou modificam uma relação jurídica. Diz-se então que elas tanto podem constituir como desconstituir. No primeiro caso, dizem-se constitutivas positivas, neste último, constitutivas negativas.
Por outro lado, e se as sentenças declaratórias têm seus efeitos retroativos, pois apenas reconhecem a existência, inexistência ou modo de ser de uma determinada situação jurídica, as sentenças constitutivas negativas têm efeito ex nunc, ou seja, não retroagem no tempo, já que é através delas que a relação jurídica é modificada.
Ao examinar a natureza da sentença proferida na ação de despejo, SYLVIO CAPANEMA DE SOUZA afirma que: “o que busca o autor, na ação de despejo, é dissolver o contrato de locação (…) trata-se, ainda, de uma ação de natureza constitutiva (…) desconstituindo o vínculo contratual.”[3]. E ainda: “Na ação de despejo não se objetiva, propriamente recuperar a posse perdida pelo locador, e sim dissolver o contrato de locação”.[4]
No mesmo sentido, a jurisprudência do E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo[5], reafirma ter a ação de despejo natureza constitutiva negativa, de modo que o pedido de resolução contratual está inserido dentro do pedido de despejo.
Tais conclusões são da mais alta relevância, pois se o contrato de locação se extingue através da sentença de despejo, o locador que pretende vender imóvel, em que está pendente sentença a ser proferida em ação de despejo, deverá conceder o direito de preferência ao réu, porque este ainda guarda a posição de locatário.
De outra banda, e se tiver suprimido o exercício do direito de preferência, o locatário poderá reclamar do alienante as perdas e danos ou, depositando o preço e demais despesas do ato de transferência, haver para si o imóvel locado, se o requerer no prazo de seis meses, a contar do registro do ato no cartório de imóveis, desde que o contrato de locação esteja averbado pelo menos trinta dias antes da alienação junto à matrícula do imóvel (art. 33 da Lei de locações).
É também de se destacar, que a sentença proferida na ação de despejo tem eficácia imediata, independente da interposição pelo vencido de recurso de apelação (art. 58, V, da lei de locações).
Por todo o exposto, se conclui que a natureza da ação de despejo é constitutiva negativa, motivo pelo qual se verifica a necessidade de análise cautelosa de operações imobiliárias, enquanto ainda estiver pendente ação de despejo.
Rodrigo Elian Sanchez e Vitória Pedroso Silva
Transporte Aéreo Internacional: Aplicação da Convenção de Montreal Apenas para Casos de Indenização por Danos Materiais por Perda de Bagagem, Atrasos e Cancelamentos de Voo – Aplicabilidade em Casos de Indenização por Danos Morais.
Como é de amplo conhecimento no meio jurídico, no julgamento ocorrido em 25/05/2017 do RE 646.331/RJ, sob a relatoria do ministro Gilmar Mendes, o Supremo Tribunal Federal firmou precedente em sede de repercussão geral (Tema 210), no sentido de que, em se tratando de danos materiais decorrente de perda de bagagem, ocorrida em transporte aéreo internacional, é inaplicável o Código de Defesa do Consumidor, sendo aplicável a Convenção de Montreal:
“Nos termos do art. 178 da Constituição da República, as normas e os tratados internacionais limitadores da responsabilidade das transportadoras aéreas de passageiros, especialmente as Convenções de Varsóvia e Montreal, têm prevalência em relação ao Código de Defesa do Consumidor”.
A diferença é que, o Código de Defesa do Consumidor não impõe limites ao valor da indenização, ao passo que a Convenção de Montreal limita os danos materiais decorrentes de perda de bagagem, à 1.000 Direitos Especiais de Saque, que, em junho/2022, correspondem a R$ 7.081,96.
A Convenção de Montreal também é aplicável nos casos que tratam de responsabilidade da Cia Aérea por danos aos passageiros, decorrentes de atraso de voo aéreo internacional:
“Convenção de Montreal:
Artigo 19 – Atraso
O transportador é responsável pelo dano ocasionado por atrasos no transporte aéreo de passageiros, bagagem ou carga. Não obstante, o transportador não será responsável pelo dano ocasionado por atraso se prova que ele e seus prepostos adotaram todas as medidas que eram razoavelmente necessárias para evitar o dano ou que lhes foi impossível, a um e a outros, adotar tais medidas”.
Como se vê, em caso de atraso de voo, é obrigação da empresa aérea promover “todas as medidas razoavelmente necessárias para evitar o dano”, dentre elas acomodação adequada do passageiro, bem como o transporte até o local da acomodação e alimentação, sob pena de ser obrigada a indenizar os danos causados.
Portanto, a depender do caso, se for comprovado pelo passageiro que a companhia aérea não adotou as medidas necessárias para mitigar os problemas advindos de atraso de voo, a Convenção de Montreal admite pedidos de indenização pelos danos materiais dele decorrentes.
Já em relação a indenização por danos morais, o precedente fixado pelo STF afastou, expressamente, a aplicação da Convenção de Montreal, fazendo com que, nestes casos, deva ser aplicado o Código de Defesa do Consumidor (sem limitação de valores), cabendo ao passageiro, contudo, provar a ocorrência dos danos morais.
Segue abaixo ementa de decisão recente (abril/2022), proferida pelo Superior Tribunal de Justiça, afirmando que deve ser aplicado o Código de Defesa do Consumidor nos casos que envolvem pedido de indenização danos morais, decorrentes de falhas na prestação do serviço de transporte aéreo internacional:
“AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL – AÇÃO CONDENATÓRIA – DANO MORAL POR CANCELAMENTO DE VOO – DECISÃO MONOCRÁTICA QUE NEGOU PROVIMENTO AO RECLAMO. INSURGÊNCIA DA PARTE DEMANDADA. 1 “No precedente firmado em sede de repercussão geral (RE 646.331/RJ – Tema 210/STF) o STF afastou expressamente a aplicação da Convenção de Montreal ao dano moral, uma vez que não estaria regulado pelo acordo aludido, atraindo a aplicação da lei geral, no caso, o CDC.” (AgInt no REsp 1944539/RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, DJe 25/11/2021) 1.1. Na hipótese sub judice, a pretensão deduzida na origem diz respeito unicamente à imposição de dano moral por cancelamento de voo. Ausente regulação da matéria em acordo internacional, aplicam-se as normas do CDC. Incidência da Súmula 83 do STJ […]2 Agravo interno desprovido. (AgInt no AREsp n. 1.937.590/SP, relator Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, julgado em 15/3/2022, DJe de 26/4/2022.)”.
Importante destacar que para pleitear indenização por danos morais, não basta simplesmente alegar que eles ocorreram; o passageiro deve se munir de documentos que comprovem a angústia e os dissabores vivenciados, como, por exemplo, fotografias, e-mails que provem perda de reuniões de negócios, ingressos de eventos, inscrições em congressos, reuniões familiares importantes etc.
Marcelo Barretto Ferreira da Silva Filho
Todos os direitos reservados – Rodrigo Elian Sanchez Sociedade de Advogados S/S.
[1] In Aulete Digital. Disponível em <Dicionário Online – Dicionário Caldas Aulete – Significado de subsidiário> Acesso em 15/05/2022.
[2] COELHO, Fabio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 12 ed. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 413.
[3] SOUZA, Sylvio Capanema de. A lei do inquilinato comentada, 8ª Ed. Rio de Janeiro: Forense, 2012, p. 256.
[4] SOUZA, Sylvio Capanema de. A lei do inquilinato comentada, 12ª Ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020, p. 53.
[5] TJSP, Apelação cível 1015562-58.2019.8.26.0554, Órgão Julgador 30ª Câmara de Direito Privado, Relatora Des. Maria Lúcia Pizzotti, v.u., data do julgamento 23/06/2020.
TJSP, Apelação Cível 1107572-96.2017.8.26.0100, Órgão Julgador 30ª Câmara de Direito Privado, Relatora Des. Maria Lúcia Pizzotti., v.u., data de julgamento 27/11/2019.
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