ABUSIVIDADE DA EXCLUSÃO DE DEPENDENTES DE PLANOS DE SAÚDE FAMILIAR, APÓS LONGO PERÍODO EM QUE ATINGIRAM A IDADE LIMITE:
Nos contratos de plano de saúde familiar existe a figura do titular e dos dependentes (estes últimos, geralmente, cônjuge e filhos). No que se refere aos filhos, os contratos geralmente preveem idade limite (via de regra, 25 anos), que, quando atingida, acarreta a exclusão dos dependentes do plano.
Ocorre que, não raras vezes, mesmo atingindo a idade limite, o plano de saúde simplesmente deixa de excluir os dependentes, fazendo com que estes continuem como beneficiários do titular. Tal inércia das operadoras, quando se consolidam por longos anos, criam expectativas e o que tem ocorrido na prática é que, não mais do que de repente, estes dependentes são surpreendidos com uma carta do plano de saúde os informando que perderam a elegibilidade prevista no contrato de plano de saúde individual/familiar, não sendo permitida sua permanência como dependentes.
Não é preciso mencionar as diversas vicissitudes geradas por tal situação, já que, junto com a notícia da exclusão, é informado prazo peremptório, em torno de 60 (sessenta) dias, a contar do recebimento da carta, em que, escoado, são os dependentes excluídos do plano, sendo que, são notórias as dificuldades para ingressar em um novo plano de saúde, notadamente por conta de novos prazos de carência, além do alto custo para novas contratações.
Ocorre que, em casos assim, ou seja, quando se trata de contratos familiares, em que os dependentes permanecem como beneficiários do plano por longo período após terem atingido a idade limite, o Judiciário tem entendido que a exclusão é abusiva.
Em outras palavras, quando, durante anos posteriores ao implemento da idade, os dependentes são mantidos como beneficiários do plano, usufruindo de sua cobertura e cumprindo com seus deveres de forma correta e pontual – inclusive com o pagamento de mensalidades, fica caracterizada a supressio, que decorre do não exercício de determinado direito por seu titular, no curso da relação contratual, gerando para a outra parte, em virtude do princípio da boa-fé objetiva, a legítima expectativa de que não mais se mostrava sujeito ao cumprimento da obrigação.
No caso, ao manter os dependentes do plano de saúde por longo período após terem completado a idade limite, o plano de saúde gera a legítima expectativa de que renunciou ao exercício da cláusula que autorizaria a exclusão, não sendo razoável que o plano de saúde escolha o momento para exercício da faculdade contratual, pois, se assim fosse, os beneficiários ficariam em situação de extrema vulnerabilidade e desequilíbrio contratual.
Na linha do que foi explicado acima, em recente caso patrocinado por nosso escritório, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo determinou a manutenção dos beneficiários no plano, vejam:
“Ação cominatória. Restabelecimento de plano de saúde. Beneficiários dependentes da titular do plano. Plano que foi cancelado sob o argumento de ausência de elegibilidade dos Autores. Questão que não pode ser a eles imputada. Incidência do princípio da boa-fé objetiva. Inércia por longo período da Ré em exigir o cumprimento de cláusula contratual. Inadmissibilidade da resilição unilateral em casos de contratos individuais/familiares, observado o artigo 13 da Lei 9.656/98. Restabelecimento do plano de saúde dos Autores que é medida de rigor. Sentença de procedência mantida. Honorários sucumbenciais majorados para 15% do valor da causa (art. 85, § 11, do CPC). Recurso não provido. (TJSP – Apelação nº 1015151-85.2020.8.26.0002 – 3ª Câmara de Direito Privado – Des. Rel. João Pazine Neto – J. 03/11/2020)
A questão se relaciona, na essência, com a segurança jurídica e proteção da confiança, fundamental para evitar distorções de direitos legitimamente constituídos e considerando que a: “segurança jurídica é um valor constitutivo do Direito, visto que sem um mínimo de certeza, de eficácia e de ausência de arbitrariedade não se pode, a rigor, falar de um sistema jurídico. [1]”
Por: Marcelo Barretto Ferreira da Silva Filho
[1] ÁVILA, Humberto. Teoria da segurança jurídica. 4. ed. São Paulo: Malheiros, 2016. p. 354 e 355.