A Medida Provisória 1.085/2021, modernização dos registros públicos e mudanças na legislação que regula a Incorporação Imobiliária e Loteamentos

Foi publicada, no dia 28 de dezembro de 2021, no Diário Oficial da União, a Medida Provisória (MP) 1.085/2021.

A MP alterou artigos da Lei nº 4.591 de 1964 no que se refere à incorporações imobiliárias, como também da Lei nº 6.015, de 1973 (Lei dos Registros Públicos), da Lei nº 6.766, de 19 de dezembro de 1979 (que regula os Loteamentos), bem como incluiu no Código Civil a possibilidade de assembleias virtuais para pessoas jurídicas de direito privado e introduziu norma para prever a prescrição intercorrente (anteriormente regulada apenas pelo Código de Processo Civil).

A MP, entre outros pontos, visa desburocratizar e fomentar o mercado imobiliário, tendo reforçado a regra da concentração dos atos na matrícula do imóvel e simplificação das operações imobiliárias. Neste sentido, alterou a redação do art. 54 da Lei Federal n.°13.097/2015, para reforçar que o terceiro interessado em adquirir imóvel ou recebê-lo em garantia não precisa realizar pesquisas além da verificação das informações constantes na matrícula imobiliária. A exceção se refere aos atos praticados por empresa em recuperação judicial e cuja falência for decretada.

Os parágrafos primeiro e segundo da art. 54 da Lei n.°13.097/2015, passaram a ter a seguinte redação:

“§ 1º Não poderão ser opostas situações jurídicas não constantes da matrícula no registro de imóveis, inclusive para fins de evicção, ao terceiro de boa-fé que adquirir ou receber em garantia direitos reais sobre o imóvel, ressalvados o disposto nos art. 129 e art. 130 da Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro de 2005, e as hipóteses de aquisição e extinção da propriedade que independam de registro de título de imóvel.

Não serão exigidos, para a validade ou eficácia dos negócios jurídicos a que se refere o caput ou para a caracterização da boa-fé do terceiro adquirente de imóvel ou beneficiário de direito real:

I – a obtenção prévia de quaisquer documentos ou certidões além daqueles requeridos nos termos do disposto no § 2º do art. 1º da Lei nº 7.433, de 18 de dezembro de 1985[1]; e

II – a apresentação de certidões forenses ou de distribuidores judiciais.”

É verdade que haverá espaço para discussão em relação aos débitos fiscais inscritos na dívida ativa, considerando que a presunção de fraude de que trata o art. 185 do Código Tributário Nacional[2].

Por outro lado, a MP criou o Sistema Eletrônico de Registros Públicos (SERP). O SERP determina que os cartórios realizem seus atos em meio eletrônico. A determinação já existia em lei (art. 37 da Lei 11.977, de 2009), mas não previa os critérios de forma detalhada e a forma de regulamentação — por isso, não era aplicada.

O SERP fará a interconexão entre todos os cartórios e o atendimento remoto aos usuários e às próprias serventias, servindo para recepção e envio de documentos, expedição de certidões e obtenção de informações em meio eletrônico.

Conforme previsto na MP, os cartórios deverão se organizar e cuidar da infraestrutura referente ao novo sistema. A normatização do SERP caberá à Corregedoria Nacional de Justiça do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). O cronograma de implantação do SERP e do registro público eletrônico dos atos jurídicos em todo o País não poderá ultrapassar 31 de janeiro de 2023.

Outra alteração no que se refere aos registros públicos é que os prazos para os oficiais analisarem os títulos submetidos à registro e os registrarem diminuiu sensivelmente, porém em consonância com o Código de Processo Civil passaram a serem contados em dias úteis.

Em resumo, o prazo que era de 30 dias corridos, para o oficial proceder ao registro ou à emissão de nota devolutiva, após a prenotação do título passou a ser de 10 dias úteis.

A questão tormentosa é que a MP entrou em vigor em 28 de dezembro de 2021[3], porém caso não seja convertida em lei no prazo de até 120 dias, deixará de vigorar. Os atos praticados sob sua vigência serão reputados válidos, porém não deixa de ser um aspecto de insegurança, não sabermos se as alterações trazidas pela MP continuarão a vigorar ou não.

Até o momento a MP já recebeu 316 propostas de emendas, motivo pelo qual se aprovada, seu texto final pode sofrer alterações.

Importante destacar, que a MP em seu texto original representa simplificação, ganho de eficiência e desburocratização do ambiente de negócios no país, motivo pelo qual olhamos com bons olhos as mudanças introduzidas.

Por fim e para facilitar, preparamos pequeno resumo das principais mudanças trazidas pela MP:

I – Universalização do acesso eletrônico às atividades dos Registros Públicos:

Criação de um sistema eletrônico unificado (SERP), com intercâmbio de documentos eletrônicos e informações entre as serventias dos Registros Públicos. Com essa medida, tornou-se possível aos usuários, a solicitação, a qualquer serventia, de certidões eletrônicas, independentemente do local de registro dos atos, e a apresentação de títulos para registro em meio eletrônico em uma plataforma nacional.

II- Criação de busca eletrônica de ônus e outras restrições sobre bens móveis e imóveis:

Criação de um sistema de consulta, por meio do SERP, que abrangerá, mediante a informação de um CPF ou CNPJ, a totalidade das indisponibilidades de bens, restrições e gravames de origem legal, convencional ou processual e dos atos em que a pessoa pesquisada conste como devedora de título protestado e não pago, garantidora real, arrendatária mercantil financeira, cedente convencional de crédito ou titular de direito sobre bem objeto de constrição processual ou administrativa. Essa consulta terá abrangência em todo o território nacional.

III- Universalização do registro por extrato:

Nessa modalidade, é dispensada a apresentação da via original do título, para fins de registro, substituída por um formulário eletrônico preenchido pelo apresentante, como instituições financeiras e tabelionatos de notas. A Corregedoria Nacional de Justiça do CNJ poderá definir, em relação aos atos e negócios jurídicos relativos a bens móveis, os tipos de documentos que serão, prioritariamente, recepcionados por extrato eletrônico. Espera-se que as garantias sobre bens móveis passem a ser registradas exclusivamente por extrato eletrônico, conforme o modelo previsto na Lei Modelo da ONU sobre Garantias Mobiliárias e já adotado em mais de 40 países, segundo dados do Banco Mundial.

IV – Criação de certidão de situação jurídica do imóvel:

Criação de certidão simplificada contendo as principais informações relativas ao imóvel e seu titular, tais como sua descrição, número de contribuinte, proprietário, direitos, ônus e restrições, judiciais e administrativas.

V – Redução de prazos e contagem conforme Código de Processo Civil:

Definição da contagem dos prazos nos Registros Públicos observando-se os critérios estabelecidos na legislação processual civil, ou seja, em dias úteis, excluindo o dia do começo e incluindo o dia do vencimento, salvo disposição em contrário. Além disso, alguns dos prazos registrais foram reduzidos, tais como: (i) registro ou emissão de nota devolutiva em 10 dias; (ii) registro em cinco dias de documentos eletrônicos apresentados por meio do SERP, escrituras de compra e venda sem cláusulas especiais, requerimento de averbação de construção e de cancelamento de garantias, bem como de títulos em reingresso na vigência da prenotação com o cumprimento integral das exigências formuladas; (iii) emissão de certidão de inteiro teor no prazo de quatro horas, de certidão de situação jurídica do imóvel em um dia e de transcrições em cinco dias; entre outros.

VI – Detalhamento do regramento relativo à incorporação imobiliária:

Facilitação no cancelamento de atos relativos à incorporação, tais como extinção automática do patrimônio de afetação quando da averbação da construção, do contrato de compra e venda ou de promessa de venda, acompanhado do respectivo termo de quitação da instituição financiadora da construção, sem necessidade de averbação específica de cancelamento, entre outros detalhamentos relativos à matéria.

VII – Reforço do Princípio da Concentração dos atos nos Registros Públicos:

Reforço do Princípio da Concentração, uma vez previsto ser a matrícula do imóvel suficiente para fins de comprovação de propriedade, direitos, ônus reais e restrições sobre o imóvel, independentemente de certificação específica pelo oficial. Nesse sentido, passa a lei a prever expressamente que não serão exigidos, para a validade ou eficácia dos negócios jurídicos ou para a caracterização da boa-fé do terceiro adquirente de imóvel ou beneficiário de direito real, a obtenção prévia de quaisquer documentos ou certidões além daqueles legalmente requeridos e, especialmente, a obtenção ou apresentação de certidões forenses ou de distribuidores judiciais.

Com relação aos bens móveis, passa-se a prever a possibilidade de registro das constrições judiciais ou administrativas no Registro de Títulos e Documentos, o que também promoverá a concentração das informações acerca dessa espécie de bem.

VIII – Dispensa do registro múltiplo em Títulos e Documentos:

Modifica-se a regra atual que exige o registro de negócios jurídicos em RTD dos domicílios de todas as partes, bastando o registro em uma única localidade. Essa dispensa vigorará somente a partir de 1º de janeiro de 2024.

Rodrigo Elian Sanchez

 

[1] O §2º, do art. 1° da Lei nº 7.433/85, estabelece como necessárias para lavratura de escrituras a comprovação do pagamento do Imposto de Transmissão intervivos, as certidões fiscais e as certidões de propriedade e de ônus reais.

[2] Contudo, entendemos, que a regra contida no art. 54 da Lei Federal n.°13.097/2015 é a regra especial e afasta aplicação do art. 185, quando a operação for imobiliária. Neste sentido: ALVIM, Eduardo Arruda; GRUBER, Rafael Ricardo. Segurança jurídica dos negócios imobiliários versus fraude à execução: ônus dos credores e ônus dos adquirentes de bens no direito civil e tributário brasileiro. Revista de Processo. Vol. 291.ano 44. P. 101-134. São Paulo: Ed. RT, maio 2019

[3]  Exceção à vigência imediata no que se refere às alterações introduzidas pela MP no art. 130 da Lei de Registros Públicos, que entrarão em vigor apenas em 2024.