CDC só incide se fornecedor praticar ato que constitua atividade habitual

A relação somente será de consumo, com a consequente aplicação das disposições do Código de Defesa do Consumidor, se o fornecedor praticar ato que constitua a sua atividade profissional e habitual.

Com esse entendimento, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça deu provimento ao recurso especial de uma empresa de transportes que foi processada por ter vendido um caminhão defeituoso a um particular.

É a primeira vez que o STJ se debruça sobre a necessidade de habitualidade e profissionalismo para definição da posição de fornecedor em uma relação jurídica. O tema foi resolvido a partir da posição de doutrinadores sobre o tema, adotada pela ministra Nancy Andrighi.

Com o provimento do recurso, os autos voltam ao Tribunal de Justiça de São Paulo, para que analise se a atividade de venda de caminhões é realizada com habitualidade pela empresa de transporte. Só assim será possível definir a existência de relação de consumo entre as partes.

 

Caminhão defeituoso 

O caso trata de um particular que comprou um caminhão usado de uma empresa de transportes, mediante financiamento junto a um banco. O veículo teve defeito e foi substituído por outro, também defeituoso. O comprador precisou arcar com o conserto do próprio bolso.

Na ação, ele pediu a resolução dos contratos de compra e venda e de financiamento, com a condenação da empresa de transportes e do banco ao pagamento da diferença de valor entre o primeiro e o segundo caminhões entregues, além dos gastos para o conserto do veículo.

A ação foi julgada improcedente em primeiro grau porque o autor não comprovou que o vício já existia à época em que fez a compra do caminhão. O Tribunal de Justiça de São Paulo, no entanto, reformou a sentença pela aplicação do Código de Defesa do Consumidor.

Pelo CDC, inverte-se o ônus da prova. Caberia à empresa de transportes comprovar que vendeu um caminhão em perfeito estado. Como isso não ocorreu, ela foi condenada. Ao STJ, tentou desqualificar a própria condição de fornecedor.

Apontou que a incidência do CDC demanda o exercício da atividade no ramo do objeto comercializado de forma habitual e profissional. E alegou que sua atividade principal é de transporte de bens, não o comércio de caminhões.

 

Atividade habitual 

Relatora, a ministra Nancy Andrighi observou que o CDC define fornecedor como toda pessoa que desenvolve atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.

O termo “atividade” traz como elemento ínsito a natureza econômica da mesma, o que implica que os atos praticados pelo fornecedor constituam sua atividade habitual. Ou seja, o conceito de fornecedor é marcado pelo profissionalismo e pela habitualidade.

A conclusão da ministra Nancy Andrighi foi alcançada com base em doutrina de Sergio Cavalieri Filho, Roberto Senise Lisboa e Teresa Ancona Lopez.

Isso não significa que uma empresa de transporte só possa ter como atividade habitual e profissional o transporte de bens. É possível que ela exerça, com habitualidade e profissionalismo, a venda de caminhões com o objetivo de obter lucro.

“Portanto, a relação somente será de consumo, com a consequente aplicação das disposições do CDC, se o fornecedor praticar ato que constitua a sua atividade profissional e habitual”, resumiu a relatora. A votação foi unânime.

 

Fonte: STJ 

REsp 2.082.785