BOLETIM INFORMATIVO – DEZEMBRO 2021

Boletim RES, Advogados 

Dezembro de 2021 

Prezados Srs., neste boletim trazemos artigos nas áreas do direito: empresarial, processual civil, cível e trabalhista. 

No campo do direito empresarial, é analisada a recente Lei nº 14.195/21 que trata acerca da desburocratização societária, proteção de acionistas minoritários e o voto plural como incentivo ao mercado de capitais brasileiro. 

Na área de processo civil, as hipóteses de cabimento de ação rescisória e a necessidade de observância dos precedentes.  

No espaço reservado para o direito cível, tratamos das principais diferenças e efeitos da cláusula resolutiva expressa e a condição resolutiva nos contratos. 

Por fim, e no campo do direito trabalhista, abordamos o cabimento da estabilidade gestante nos casos de demissões com e sem justa causa. 

Lembramos que em nosso site, você pode sempre encontrar notícias atualizadas; uma boa leitura! 

Índice: 

Direito Empresarial: 

O voto plural como mecanismo de alavancagem do mercado de capitais brasileiro. 

Fls………………………………………………………………………………………………………….03-09 

– Flávia de Faria Horta Pluchino 

Direito Processual Civil: 

O sistema de precedentes judiciais e a ação rescisória. 

Fls………………………………………………………………………………………………………….10-16 

– Rodrigo Elian Sanchez 

Direito Cível: 

Cláusula resolutiva expressa x condição resolutiva. 

Fls………………………………………………………………………………………………………….17-21 

– Marcelo Barretto Ferreira da Silva Filho 

Direito Trabalhista: 

Estabilidade gestante x demissão por justa causa.  

Fls…………………..……………………………………………………………………………………..22-25 

– Eduardo Galvão Prado 

O Voto Plural como Mecanismo de Alavancagem do Mercado de Capitais Brasileiro. 

A Lei 14.195/21, sancionada em 26/08/2021, dentre outros temas envolvendo a desburocratização do ambiente de negócios no País, trouxe importantes alterações na Lei de Sociedade por Ações (Lei 6.404/76), dentre elas, a ampliação da proteção dos acionistas minoritários, através da possibilidade de criação, pelas companhias abertas e fechadas, de classes de ações ordinárias com o denominado voto plural.  

  

O voto plural pode ser compreendido como um privilégio conferido a determinada ação de uma companhia, que passa a ter maior número de votos em relação às demais ações da mesma companhia.  

  

Até o advento da Lei 14.195/21, este privilégio era uma prerrogativa exclusiva do Estado, na hipótese de desestatização de sociedades, com a perda do controle estatal, as chamadas golden shares.  

  

Referidas ações conferiam ao poder público poderes especiais nas deliberações das assembleias gerais das companhias.  

  

A regra geral adotada pelo direito societário brasileiro é a da proporcionalidade, em que cada ação dá direito a um voto nas deliberações sociais (one share, one vote). Segundo Modesto Carvalhosa, a vedação então existente ao voto plural, tinha por finalidade a manutenção do equilíbrio entre poder de controle e capital investido, bem como evitar abusos por parte de acionistas controladores1.  

  

A mudança de posicionamento do legislador brasileiro surge como uma estratégia para incrementar o mercado de capitais no País, em consonância com a evolução regulatória de países como os Estados Unidos, Inglaterra, França, Itália e Hong Kong, na medida em que a adoção do voto plural permite a dissociação entre poder político e poder econômico, dentro da sociedade.  

  

É o que se observa no parecer proferido em plenário à MPV nº 1.040 de 20212:  

  

“Inovação já incorporada em jurisdições como Singapura, Hong Kong, Estados Unidos e Reino Unido, a medida é necessária para tornarmos o mercado de capitais brasileiro mais dinâmico e para evitar perdas de listagem de empresas brasileiras para as quais a manutenção do controle acionário, num estágio inicial de abertura de capital, é fator essencial. Destacamos, ainda, que o voto plural é mecanismo mais transparente de descasamento entre poder econômico e político que as intrincadas engenharias societárias adotadas por companhias brasileiras, via manipulação do mecanismo de ações preferenciais.”  

  

A ação ordinária com voto plural confere ao acionista o direito a tantos votos quantos forem atribuídos àquela única ação. Ou seja, o acionista terá, por meio de uma única ação, direito de contabilizar mais de um voto nas deliberações sociais.  

  

Na prática, esse mecanismo permite que acionistas que detenham pequena parcela representativa do capital social exerçam maior poder político na sociedade.  

  

Geralmente, essas ações são atribuídas aos fundadores ou a outras pessoas que são de grande importância para o desenvolvimento do negócio.  

  

Neste sentido, ele funciona como um estímulo à abertura de capital de sociedades, especialmente startups, que necessitam de grande aporte de valores para seu desenvolvimento, sem que seus fundadores ou acionistas chaves, percam o controle dos negócios sociais neste processo.  

  

Intitulado de “Da Proteção de Acionistas Minoritários”, o art. 5º, da Lei 14.195/21 introduziu o inciso IV, ao artigo 16 e o artigo 110-A, na Lei 6.404/76 – Lei das Sociedades Anônimas.  

  

Assim, a partir do advento da Lei 14.195/21, as companhias abertas e fechadas ficaram autorizadas a criarem classes de ações ordinárias com o denominado voto plural, não superior a 10 (dez) votos por ação ordinária, vedado apenas nas empresas públicas, sociedades de economia mista e suas subsidiárias e nas sociedades controladas direta ou indiretamente pelo poder público.  

  

Nas companhias abertas, contudo, a instituição do voto plural deve ocorrer antes que a classe de ação ordinária seja negociada em mercados organizados de valores mobiliários (inc. II, art. 110-A, LSA).  

  

A despeito de sua necessidade, como forma de incentivar o crescimento do mercado de capitais brasileiro, alguns doutrinadores defendem ser prematura a instituição desse mecanismo no Brasil, por entenderem que ele está sendo introduzido de forma simplista, acompanhado de insuficientes mecanismos de proteção aos minoritários, não titulares desse privilégio.  

  

Para estes autores, mecanismos que conferem a uma única pessoa ou a um pequeno grupo de acionistas um poder acentuado nas deliberações sociais, tendem a se transformar em abuso, quando não existem institutos sólidos de proteção ao investidor. A dissociação entre controle e propriedade pode, por exemplo, incentivar a persecução de benefícios particulares pelos controladores.  

  

Como forma de resguardar a proteção dos minoritários não detentores desse privilégio e dos investidores, a Lei 14.195/21 estabeleceu uma série de salvaguardas ao voto plural no Brasil.  

  

Uma das principais salvaguardas diz respeito à limitação dos votos de cada ação ordinária com voto plural a 10 votos, assim como a limitação desse direito no tempo, válido por até 7 anos e cuja prorrogação depende que seja observado concomitantemente, aprovação por acionistas que representem, no mínimo, metade do total de votos conferidos à ações com direito a voto e das ações preferenciais sem direito a voto ou com voto restrito; sejam excluídos das votações os titulares de ações da classe cujo voto plural se pretende prorrogar; e seja assegurado aos acionistas dissidentes, nas hipóteses de prorrogação, o direito de retirada.   

 Além disso, houve limitação quanto às matérias em que o voto plural pode ser adotado. Neste sentido, o voto plural não pode ser usado em assembleias que deliberarem a respeito da remuneração de administradores, nem sobre transações com partes relacionadas (§12, art. 110-A).  

  

Outras importantes proteções incluídas na Lei 14.195/21 são:  

  

  • Os acionistas dissidentes da deliberação sobre as ações com voto plural terão o seu direito de recesso assegurado, exceto nos casos em que a criação dessas ações já estiver prevista ou autorizada pelo estatuto social da empresa;  

  

  • Uma vez autorizada a negociação das ações com voto plural, as suas características só poderão ser alteradas para reduzir os direitos ou vantagens dessas ações;  

  

  • Ações com voto plural serão automaticamente convertidas em ações sem voto plural, caso sejam transferidas para terceiros;   
  • São vedadas as operações de incorporação ou cisão de companhias que não adotem o voto plural caso a empresa incorporadora, sobrevivente ou resultante utilize o instrumento;  

 Apesar das críticas, o voto plural foi bem recebido pelo mercado de capitais, por operar simultaneamente como um estímulo ao empreendedorismo brasileiro e à competitividade da bolsa nacional, encorajando especialmente as startups a abrirem seu capital, sem a perda do controle sobre a gestão dos negócios.  

  

Ao mesmo tempo, incentiva os investidores que se sentem mais seguros de investir em companhias com controle consolidado nas mãos dos criadores do negócio, que têm maior interesse e comprometimento com o sucesso das atividades a longo prazo.  

  

Bibliografia  

  

CARVALHOSA, Modesto. Voto Plural: evolução ou retrocesso? In Diálogos com Coutinho de Abreu – Estudos Oferecidos no Aniversário do Professor. Coimbra: Almedina, 2020.  

  

Parecer Proferido em Plenário à MPV nº 1.040 de 2021 – Disponível em <https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=2026492&filename=PRLP+1+%3D%3E+MPV+1040/2021> Acessado em 21/11/2021  

  

Novas Regras de Proteção dos Acioniostas Minoritários – Disponível em <http://blog.embsa.com.br/blog/novas-regras-de-protecao-dos-acionistas-minoritarios> Acessado em 21/11/2021.  

  

BRAGA, Anna Luiza Pires da Costa. A Mitigação do Princípio “One  Share, One Vote”. Trabalho de Conclusão de Curso (Direito Societário). FGV Direito Rio. Rio de Janeiro, 2020.   

Flávia de Faria Horta Pluchino 

O Sistema de Precedentes Judiciais e a Ação Rescisória. 

É valor imanente à qualquer sistema jurídico a estabilidade das relações jurídicas. Neste sentido e em nosso país a garantia da “coisa julgada” foi alçada ao patamar de cláusula pétrea (art. 5°, XXXVI, CF/88). Em apertada síntese, a coisa julgada é atributo pelo qual se torna imutável e indiscutível a decisão de mérito3, não mais sujeita a recurso.  

  

Se percebe, portanto, que a garantia da coisa julgada está intimamente ligada ao princípio da segurança jurídica, na medida em que promove confiança e fornece previsibilidade, esta última entendida como cognoscibilidade, confiabilidade e calculabilidade. Ou seja, é preciso que as pessoas tenham acesso aos possíveis significados dos textos normativos, que seja assegurada a estabilidade das situações jurídicas consolidadas, bem como que os cidadãos possam visualizar as consequências jurídicas de seus atos4.  

  

A coisa julgada, cumpre parte deste escopo ao garantir que após o exercício pleno do contraditório, a decisão final de mérito da qual não caiba mais recursos não poderá ser revista.  

  

À despeito de tal garantia, a lei em hipóteses excepcionais permite a desconstituição da coisa julgada, podendo ser realizado novo julgamento do caso, através da ação rescisória.  

  

As hipóteses de cabimento da ação rescisória (meio autônomo de impugnação) sempre foram restritas, porém este exíguo rol sofreu recentes alterações. Na vigência do Código de Processo Civil de 1973, cabia ação rescisória quando a sentença de mérito houvesse violado literal disposição de lei (art. 485, CPC/73). Entretanto e com a entrada em vigor do Código de Processo Civil de 2015 (art. 966, V) a ação rescisória passou a ser cabível quando a decisão “violar manifestamente normajurídica”.  

  

Ou seja, o CPC/2015 deu novo enfoque ao admitir o cabimento quando a violação literal se der à norma jurídica, o que foi comemorado por boa parte da doutrina que entendia que o texto do CPC de 1973 estava ultrapassado, desconsiderando, inclusive, que a norma jurídica é extraída através de atividade lógica interpretativa. Muitas vezes para se extrair o significado de uma norma o intérprete se vale de técnicas hermenêuticas como também se guia pelos vetores axiológicos contidos no ordenamento jurídico.  

  

Questão significativa é que se a violação literal deixou de ser a texto de lei e passou a ser de norma jurídica, a redação dada pelo CPC/2015 passou a permitir o cabimento da ação rescisória quando a decisão a ser rescindida violar precedente obrigatório. O precedente obrigatório é uma espécie de norma jurídica delineada pelos tribunais, quando do julgamento de determinado caso concreto, porém cujos efeitos se irradiam para além daquele caso piloto.  

  

Por outro lado, a redação dada pelo Código de Processo Civil de 2015 ao incisivo V do art. 966 demonstra a relevância sistêmica que o legislador concedeu ao sistema de precedentes brasileiros.  

  

Ou seja, atualmente a ação rescisória é cabível em qualquer hipótese de violação manifesta de norma jurídica; o que incluiu inclusive normas não expressas literalmente nos textos legais, mas relevados pela interpretação, como os princípios (o gênero norma jurídica, abarca tanto as espécies: regras e princípios).  

  

Porém, e para que seja admitida a ação rescisória, a violação deve ser manifesta, ou seja, a afronta à norma deve ser possivel de ser verificada de imediato, sem a necessidade de reexame de provas ou produção de novas.  

  

Por outro lado, sabemos, que a lei pode conter mais de uma interpretação válida, sendo, portanto, necessário que dentre os resultados interpretativos possíveis, para se garantir a unidade do direito, que os tribunais pacifiquem a atividade interpretativa. Tal função pode ser exercida pelo Supremo Tribunal Federal através da edição de súmulas vinculantes, ou pelo próprio Supremo ou demais tribunais através da fixação de precedentes obrigatórios. Os precedentes obrigatórios, nada mais são que os julgamentos de casos concretos de onde se formula razões generalizáveis, a serem aplicadas em casos semelhantes5.  

  

Se houver por exemplo, precedente formado pelo Superior Tribunal de Justiça ao julgar recurso especial repetitivo, dando interpretação à norma federal, os demais juízes deverão obrigatoriamente observar tal entendimento no julgamento de casos semelhantes, no futuro.  

  

Assim é suscetível de ser rescindida a decisão que desrespeitar o entendimento fixado pelo STJ ou até que aplicou erroneamente o precedente, adotando as suas razões de decidir em caso que apresentava elementos distintos do caso piloto (art. 966, §5°, CPC/2015).  

  

É importante, porém observar, que se após uma dada sentença transitar em julgado, vier à ser fixado precedente que seja divergente da solução dada pela referida sentença, não é cabível a ação rescisória, já que o precedente não pode retroagir para atingir situações pretéritas, sob pena de violação do princípio da segurança jurídica.   

  

Obviamente que a decisão dada no caso concreto mesmo que em desconformidade com futuro precedente, deve estar dentro das   interpretações plausíveis do texto legal, conforme entendimento sumulado o verbete 343 do STF, pelo qual havendo divergência interpretativa ao tempo em que proferida a decisão rescindenda, não cabe ação rescisória fundada em violação de norma jurídica (Supremo Tribunal Federal - RE 590.809/RS).  

  

Ou seja, se na ocasião em que foi proferida uma sentença existiam três correntes interpretativas para um artigo da lei federal, e o juiz adotou uma destas correntes para fundamentar a sentença, a mesma não poderá ser revista, mesmo que precedente futuro venha a adotar como correta outra corrente interpretativa. Caso diverso é quando o juiz ao prolatar a sentença, tenha adotado entendimento contrário as todas as correntes interpretativas controvertidas nos tribunais na ocasião.  

  

Nesta última hipótese, seria caso de se rescindir a sentença, se for fixado precedente com entendimento divergente da solução adotada na sentença rescindenda, já que a sentença não se lastreava em uma das correntes interpretativas consideradas como “válidas” pelos tribunais, na época.  

  

Por fim, cabe destacar que em relação a impossibilidade de retroatividade dos precedentes quando a decisão rescindenda tiver se fundamentado em interpretação controvertida nos tribunais comporta  uma exceção; é a hipótese de a sentença ter se fundamentado em lei ou ato normativo considerado posteriormente inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, em que caberá a ação rescisória, em até dois anos contados do trânsito em julgado da decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal (art. 525, § 15°, CPC).  

  

A exceção é admitida em razão da importância da preservação da autoridade do texto constitucional, hipótese em que se admite mitigar a estabilidade do julgado para evitar que uma decisão contrária literalmente a constituição continue a produzir efeitos, o que é mais sensível em casos de relação continuada (ex. sentença que condena ao pagamento de alimentos).  

  

Em resumo, com a entrada em vigor do Código de Processo Civil de 2015 foi concedido destaque aos precedentes judiciais, alçando sua violação as hipóteses excepcionais de cabimento da ação rescisória, o que merece ser observado pelos operadores do direito, estrategicamente, no aconselhamento e condução de casos nos tribunais.   

Rodrigo Elian Sanchez 

Cláusula Resolutiva Expressa x Condição Resolutiva. 

Em um cenário em que o mercado imobiliário está novamente aquecido, a aquisição de áreas para incorporação imobiliária tem sido recorrente, sendo que as incorporadoras têm padronizado em seus contratos o que denominam ser ‘condições resolutivas’.   

  

Nas denominadas condições resolutivas, estão elencadas diversas análises que a incorporadora fará, tanto em relação à documentação do imóvel prometido à venda, quanto em relação aos vendedores, passando ainda por questões ambientais e até análise da viabilidade de aprovação do projeto pretendido. Após a referida análise, estando “tudo de acordo” a incorporadora declara ter superado “as condições resolutivas”, sendo o negócio, então, confirmado.  

  

Os contratos também preveem que mesmo existindo débitos, pendências que pesem sobre o imóvel ou sobre os vendedores, a compradora poderá considerar superadas as denominadas “condições resolutivas”, sendo o negócio confirmado.  

  

Porém e apesar de ter sido padronizado tal mecanismo nos contratos de aquisição de imóveis para incorporação é importante destacar que há, na verdade, uma confusão entre dois institutos, que na verdade tem apenas o nome semelhantes: cláusula resolutiva expressa e a condição resolutiva.  

  

A cláusula resolutiva expressa, disciplinada nos arts. 474 e 475 do Código Civil, é utilizada nos negócios jurídicos para gestão e alocação de riscos, inclusive para hipóteses de impossibilidade superveniente de conclusão, envolvendo caso fortuito e força maior.  

  

Sua principal característica é que, ocorrendo o evento previsto, o credor está autorizado a exigir, alternativamente, a execução do contrato ou a sua resolução, mediante envio de simples manifestação. Ou seja, ela não extingue automaticamente o contrato; apenas abre ao credor o direito de optar entre a execução da prestação ou a resolução   

  

Já a condição resolutiva (ou clausula de condição) disciplinada nos arts. 121 e seguintes do Código Civil, exige a existência de três elementos essenciais6: (i) a voluntariedade (não há condição sem a vontade das partes); (ii) a futuridade (deve se referir, obrigatoriamente, a um evento futuro); e (iii) a incerteza (deve haver dúvida sobre a ocorrência ou não do evento).  

  

Os principais efeitos da condição resolutiva são: o efeito liberatório (art. 128, CC), pelo qual as partes, de forma automática (independentemente de manifestação de vontade), se desobrigam do cumprimento de determinadas obrigações e prestações e o efeito restitutório, que impõe o retorno (ainda que parcial) das partes a estado anterior ao contratado, em função da perda da causa para a permanência de todos os efeitos alcançados por ele7

  

Podemos dizer então que a principal característica da condição resolutiva, portanto, é que ela independe de manifestação de qualquer das partes contratantes, na medida em que ela extingue o contrato de modo automático, por força de lei, quando o evento condicional vem a ocorrer.  

  

Esclarecidas as principais características da clausula resolutiva expressa e da condição resolutiva, podemos então concluir que a principal diferença entre elas é:  

  

  • cláusula resolutiva expressa, é aquela situação específica de descumprimento prevista pelas partes, previamente, como forma de controle de riscos, e que, ocorrendo, enseja a perda do interesse da parte no prosseguimento do contrato. Trata-se de direito cujo implemento depende da vontade de uma das partes. É uma prerrogativa da parte, diante do inadimplemento da outra, que acaba levando a perda do interesse útil na prestação. A parte então pode decidir se extingue ou não o contrato.  

  

  • condição resolutiva, é aquela que encerra os efeitos do contrato, automaticamente, e independente da manifestação das partes, extinguindo o contrato e liberando as partes dos vínculos e obrigações nele pactuadas. O evento previsto no contrato como condição, deve ser sempre externo, ou seja, não pode constituir uma prestação devida por qualquer das partes ou por terceiro (pois, do contrário, não seria uma condição, mas sim uma obrigação a ser adimplida ou inadimplida).  

  

Não obstante, no dia a dia, nos depararmos com diversas cláusulas contratuais, prevendo o que o mercado optou por denominar de “condições suspensivas e condições resolutivas”, mas cujos efeitos nem sempre correspondem àqueles de uma condição resolutiva (que exige a resolução automática do contrato), mas sim de uma cláusula resolutiva expressa (que serve para gestão e alocação de riscos, e permite que o incorporador opte por executar ou não o contrato), acabando por “padronizar o erro” de nomenclatura nos contratos.  

  

As questões que envolvem condição resolutiva e cláusula resolutiva expressa vão muito além das breves linhas acima e merecem atenção dos operadores do direito, pois, de certo, a mera nomenclatura da cláusula imputada no contrato, por vezes, não corresponde à intenção das partes ao estipulá-la, o que pode gerar controvérsia em sua interpretação e aplicação, lembrando que, ocorrendo o implemento de uma ‘cláusula resolutiva expressa’, a parte está autorizada a resilir o contrato (sendo uma opção do credor), ao passo que, ocorrendo o implemento de uma ‘condição resolutiva’, ocorrerá a extinção automática do contrato, sem que o credor possa optar por leva-lo adiante.  

Marcelo Barretto Ferreira da Silva Filho 

Estabilidade de Gestante x Demissão por Justa Causa. 

Nos termos do artigo 10 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, a estabilidade gestante protege a empregada contra demissão sem justa causa, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto.  

Consequentemente, a proteção da estabilidade gestante, não se aplica aos casos de demissão por justa causa. De acordo com o artigo 482 da CLT, configura-se justa causa as seguintes práticas: a) ato de improbidade; b) incontinência de conduta ou mau procedimento; c) negociação habitual sem permissão do empregador e quando constituir ato de concorrência à empresa para a qual trabalha o empregado, ou for prejudicial ao serviço; d) condenação criminal do empregado, passada em julgado, caso não tenha havido suspensão da execução da pena; e) desídia no desempenho das respectivas funções; f) embriaguez habitual ou em serviço. Atualmente, os tribunais consideram alcoolismo uma hipótese de afastamento por doença não passível por demissão por justa causa; g) violação de segredo da empresa; h) ato de indisciplina ou de insubordinação; i) abandono de emprego; j) ato lesivo da honra ou da boa fama praticado no serviço contra qualquer pessoa, ou ofensas físicas, nas mesmas condições, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem; k) ato lesivo da honra ou da boa fama ou ofensas físicas praticadas contra o empregador e superiores hierárquicos, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem; l) prática constante de jogos de azar; m) perda da habilitação ou dos requisitos estabelecidos em lei para o exercício da profissão, em decorrência de conduta dolosa do empregado, ou a prática de atos atentatórios à segurança nacional. 

Com isso, se uma empregada gestante praticar qualquer conduta que se encaixe no rol do artigo 482 da CLT, ela poderá ser despedida sem justa causa.  

Neste caso, a empregada gestante não terá direito a receber a indenização referente a estabilidade, mas apenas, as verbas referentes a demissão por justa causa como, saldo de salário, férias vencidas e FGTS do mês da rescisão.  

Este entendimento é pacífico em todos os tribunais. Segue decisão do Tribunal Superior do Trabalho neste sentido:  

“RECURSO DE REVISTA. TRABALHO DOMÉSTICO. JUSTA CAUSA. QUEBRA DE FIDÚCIA. ESTABILIDADE DA GESTANTE 1. É certo que a proteção à empregada gestante conferida pelo art. 10, II, “b”, do ADCT traduz-se em direito fundamental que visa a proteger precipuamente o nascituro. 2. Tal escopo da lei, entretanto, não constitui salvo conduto para a tolerância de justa causa cometida por empregada gestante. 3. Tipifica justa causa passível de despedida sem ônus a conduta habitual de empregada doméstica consistente em usar, sem autorização, produtos cosméticos e de higiene pessoal da empregadora. 4. Reconhecida a quebra de fidúcia contratual decorrente de justa causa comprovada, não subsiste a garantia provisória de emprego prevista no art. 10, II, “b”, do ADCT. 5. Recurso de revista da Reclamada de que se conhece e a que se dá provimento para restabelecer a sentença, que julgou improcedentes os pedidos” (RR-878-70.2014.5.10.0020, 4ª Turma, Relator Ministro Joao Oreste Dalazen, DEJT 10/08/2017).  

Como qualquer caso de demissão por justa causa, o empregador deve seguir rigorosamente os procedimentos necessários para confirmar a justa causa em eventual processo judicial.  

Neste sentido, podemos concluir que a empregada gestante que pratica qualquer conduta passível de demissão por justa causa, não está protegida pela estabilidade gestante.  

Eduardo Galvão Prado 

Todos os direitos reservados – Rodrigo Elian Sanchez Sociedade de Advogados S/S.