BOLETIM INFORMATIVO – MARÇO 2023
Boletim RES, Advogados
Março de 2023
Prezados Srs., neste boletim trazemos artigos nas áreas do direito: processual civil, empresarial, sucessório e trabalhista.
No campo do direito processual civil, abordamos como o financiamento profissional de litígios pode servir de incentivo ao cumprimento dos contratos e das leis.
No espaço reservado para o direito empresarial, tratamos sobre o entendimento do STJ e jurisprudência acerca da apuração de haveres na dissolução parcial da sociedade.
Na área do direito sucessório, analisamos a possibilidade de realização de inventário e partilha extrajudicial quando há testamento e a participação de menores ou incapazes.
Por fim e no campo do direito trabalhista, versamos sobre como a utilização inadequada de informações de terceiros pode caracterizar falta grave de empregado.
Lembramos que em nosso site, você pode sempre encontrar notícias atualizadas; uma boa leitura!
Índice:
Direito Processual Civil:
Como o financiamento profissional de litígios pode servir de incentivo ao cumprimento dos contratos e das leis.
Fls………………………………………………………………………………………………………….05-11
– Flavia de Faria Horta Pluchino
Direito Empresarial:
Apuração de haveres na dissolução parcial da sociedade: o STJ e a mudança da jurisprudência.
Fls………………………………………………………………………………………………………….12-18
– Rodrigo Elian Sanchez
Direito Sucessório:
É possível realizar inventário e partilha extrajudicial, mesmo havendo testamento, menores ou incapazes?
Fls………………………………………………………………………………………………………….19-22
– Marcelo Barretto Ferreira da Silva Filho
Direito Trabalhista:
Utilização inadequada de informações de terceiros pode caracterizar falta grave de empregado.
Fls………………………………………………………………………………………………………….23-24
– Eduardo Galvão Prado
Como o Financiamento Profissional de Litígios Pode Servir de Incentivo ao Cumprimento dos Contratos e das Leis.
Neste artigo, buscaremos demonstrar como o financiamento profissional de litígios pode incrementar a economia, ao incentivar o cumprimento de contratos e da lei, aumentando a eficiência e a segurança jurídica das relações comerciais e, consequentemente, a frequência com que negócios são celebrados.
O financiamento de litígios é um contrato pelo qual um agente econômico aceita financiar os custos de uma disputa judicial ou arbitral, em troca de um percentual do resultado econômico obtido.
Trata-se de um investimento de risco, onde a força do direito da parte é a garantia de retorno do investidor. Em outras palavras, a parte financiada somente fica obrigada a pagar o financiamento, se o projeto gerar resultados positivos.
Da perspectiva do financiador, o financiamento é interessante, porque os possíveis resultados do projeto divergem dos demais investimentos e independem de variáveis econômicas.
Como o sucesso do litígio é o fator preponderante para a aceitação do financiamento pelo investidor, o processo de verificação da viabilidade do projeto envolve análise jurídica, financeira e temporal da demanda.
A análise jurídica visa obter o maior número de informação sobre a causa, a fim de verificar a força do direito das partes e a probabilidade de sucesso. Já a análise financeira, relaciona-se com a solvência da contraparte e sua capacidade econômica de honrar a dívida.
A análise temporal, por sua vez, verifica as estratégias de recuperação do crédito e o prazo para o retorno do investimento.
Mas como o financiamento de litígios age como força motriz na economia de mercado?
Como cediço, em muitas disputas judiciais, há uma enorme assimetria entre as partes litigantes, tanto do ponto de vista econômico, quanto do ponto de vista técnico.
De um lado, há indivíduos com recursos limitados para suportar os custos do litígio e o tempo de espera por uma solução, também chamados de Litigantes Eventuais e, de outro, se encontra uma grande corporação, com orçamentos abastados para fazer frente aos custos da demanda, denominada de Litigantes Recorrentes.
Na arbitragem, a situação se complica ainda mais, chegando mesmo a impedir seu acesso ao homem médio.
Segundo Marc Galanter[1], as vantagens dos Litigantes Recorrentes podem ser assim enumeradas:
(i) o litigante recorrente tem conhecimento prévio acumulado e, portanto, é capaz planejar seus movimentos e transações futuros com base na avaliação dos riscos;
(ii) os litigantes recorrentes têm acesso à especialistas, ao mesmo tempo em que diminuem seus custos porque trabalham em economia de escala;
(iii) como trabalham em escala, os litigantes recorrentes podem adotar o que o autor chama de estratégia minimax (eles podem maximizar ganhos a longo prazo, ainda que isto implique perda total em alguns casos);
(iv) os litigantes recorrentes, por sua proximidade com as instituições, têm maior facilidade em desenvolver mecanismos informais facilitadores de obtenção de vantagens por funcionários oficiais;
(v) os litigantes recorrentes têm uma reputação de “combatente” a manter, a partir da qual têm em seu favor reconhecido o respeito como negociador;
(vi) os litigantes recorrentes podem, por fim, disputar as regras da litigância, pois, ao contrário dos litigantes eventuais, – que buscam resultados pessoais tangíveis em cada demanda, – aqueles geralmente têm por objetivo a formação de uma jurisprudência favorável, que o beneficie em casos futuros.
Neste aspecto, o financiamento profissional de litígios se torna uma importante ferramenta para equilibrar o jogo, ao diminuir a disparidade econômica e técnica entre as partes.
Via de regra, o descumprimento de um contrato ou da lei relaciona-se ao sopesamento dos ganhos e das perdas esperadas com o inadimplemento. Se as perdas decorrentes do inadimplemento forem menores que os ganhos do adimplemento, a parte terá um incentivo ao descumprimento.
Em muitos casos, mesmo quando a vítima descobre o ilícito, ela pode optar por não judicializar o problema, pois a iniciativa litigiosa pode ser mais custosa que arcar com o prejuízo, seja em razão do tempo de duração do litígio, seja pela falta de recursos para contratar bons profissionais para atuar na causa.
Por outro lado, a decisão judicial é uma solução que a parte não tem como controlar, sendo que o resultado pode ser aquém do esperado ou, mesmo quando reconhece exatamente o direito pretendido, a parte pode não conseguir receber da contraparte, que possui mecanismos para protelar o pagamento e forçar um acordo muito reduzido em relação ao valor devido.
Esses fatores são considerados pelas grandes corporações nas suas relações jurídicas e podem ensejar o descumprimento do contrato ou da lei, por ser mais vantajoso economicamente.
E é justamente neste ponto que o financiamento de litígios se torna uma importante ferramenta de incentivo ao cumprimento dos contratos e da Lei, pois quanto mais efetivos forem os mecanismos legais à disposição dos indivíduos para a defesa de seus direitos, mais custoso se torna o descumprimento dos contratos e da lei.
Consoante BEDI E MARRA[2], citados por CASTRO:
“O financiamento faz com que o valor dos danos que a parte inadimplente espera pagar fique mais próximo dos danos efetivamente incorridos pela parte adimplente. O financiamento de litígios gera isso porque ele funciona como um mecanismo de execução, erodindo algumas razões que podem levar a parte inadimplente a não pagar o montante total dos danos. Contratantes que, de outro modo, deixariam de processar a outra parte por questões de liquidez ou risco, agora estarão mais inclinados a processar. (…) E os contratantes estarão menos inclinados a celebrar acordos por menos do que a totalidade da indenização porque o financiamento reduz ou elimina problemas de liquidez e risco, os quais, muitas vezes levam uma parte a celebrar acordos por valores subótimos.” (BEDI E MARRA, 2021, p. 597 apud CASTRO, 2023, p. 23).
O só fato do aceite do financiador sinaliza para a outra parte a força do direito do financiado. E à medida que este passa a ter acesso aos recursos e à experiência para bancar a lide no longo prazo, há um desestímulo da outra parte de adotar estratégias de procrastinação e aumento dos custos do processo, permitindo que as demandas sejam decididas no mérito, e não com base no apetite de uma delas de protelar o litígio.
Neste sentido, há um incremento na posição negocial dos litigantes eventuais que se equipara à posição das litigantes recorrentes, o que altera a dinâmica das vantagens econômicas do descumprimento, além de aumentar as chances de um acordo mais próximo ao dano suportado.
Em conclusão, o financiamento de litígios, ao democratizar o acesso à justiça, equiparando as forças no litígio, produz maior eficiência no sistema de resolução de conflitos o que, por sua vez, refletirá nas decisões dos agentes econômicos de atuarem de forma aderente às regras contratuais e legais.
A consequência é o aumento da segurança jurídica e do bem-estar da sociedade como um todo.
Bibliografia
CASTRO, João Mendes de Oliveira. O Financiamento de Litígios no Sistema de Solução de Controvérsias. In Litgation Finance e Special Situations: Financiamento de litígios, aquisição de direitos creditórios e outras operações. Guilherme Setogui J. Pereira, coordenador. São Paulo: Thompson Reuters, 2023.
LANG, Camila Du Plessis. Financiamento de Litígio: estruturas e tendências atuais. In Litgation Finance e Special Situations: Financiamento de litígios, aquisição de direitos creditórios e outras operações. Guilherme Setogui J. Pereira, coordenador. São Paulo: Thompson Reuters, 2023.
GALANTER, Marc. Why the haves come out ahead? Speculations on the limits of legal change Volume 9:1 Law and Society Review, 1974, pp. 95-96.
Flavia de Faria Horta Pluchino
Apuração de Haveres na Dissolução Parcial da Sociedade: o STJ e a Mudança da Jurisprudência.
No caso da retirada de sócio, sua exclusão ou seu falecimento, a apuração dos haveres devidos deve ser calculada conforme previsto no contrato social da sociedade, privilegiando-se, desta forma, os princípios da autonomia da vontade das partes e da força obrigatória dos contratos.
Porém, na ausência de estipulação e existindo divergência, essas controvérsias invariavelmente são levadas ao judiciário, já que a utilização de diferentes metodologias de cálculo, podem levar a diferenças brutais nos valores a serem pagos.
Existem pelo menos quatro valores que podem ser atribuídos às quotas da sociedade limitada, dependendo dos objetivos da avaliação: (i) valor nominal, (ii) valor de negociação, (iii) valor econômico e (iv) valor patrimonial[3]. Conforme definição de Fábio Ulhoa Coelho, seriam assim definidos:
Primeiro. As participações societárias em sociedades limitadas têm valor nominal, resultante da divisão do capital social pelo número de quotas. Se um sócio subscreve 1.000 quotas no valor (nominal) de R$ 1,00 cada, ele é responsável por aportar na sociedade, no ato de constituição do capital o montante de R$ 1.000,00. Segundo. A quota possui valor de negociação, que corresponde àquele que, de um lado, o comprador está disposto a pagar para a titularizar e, de outro, o vendedor concorda em receber para a disponibilizar. Este valor é definido exclusivamente em função do acordo de vontade desses sujeitos de direito. O preço final será fixado a partir de inúmeras variáveis, podendo redundar em ágio ou deságio, a depender das estratégias envolvidas (reposicionamento de concorrentes no mercado, intenção de incremento de capital após a aquisição da sociedade, possibilidade de valorização de marca mediante implementação de estratégias de marketing etc.). Terceiro. A quota pode ser avaliada por especialistas em avaliação de ativos empresariais (bancos de investimentos, contabilistas etc.) com o objetivo de mensurar o valor que seria racional alguém pagar para tornar-se seu titular. É chamado de valor econômico o derivado desta mensuração, feita por modelos de múltiplos ou de fluxo de caixa descontado. Note-se que este valor é calculado pelos experts para nortear negociações. Comprador e vendedor, contudo, sabem de suas necessidades e objetivos e normalmente atribuem às quotas um valor de negociação diferente do econômico. Quarto. A quota tem, por fim, valor patrimonial, que é a divisão do patrimônio líquido da sociedade pelo número de quotas. O valor patrimonial, por sua vez, desdobra-se em três categorias, dependendo da natureza do balanço que mensura o valor do patrimônio líquido da sociedade: (a) valor patrimonial contábil (balanço periódico); (b) valor patrimonial contábil em data presente (balanço especial); (c) valor patrimonial real (balanço de determinação).
Até recentemente o entendimento consolidado na jurisprudência era no sentido de que o mais adequado para o cálculo dos haveres seria a utilização da metodologia do fluxo de caixa descontado.
Neste sentido:
“DIREITO EMPRESARIAL. DISSOLUÇÃO PARCIAL DE SOCIEDADE POR QUOTAS DE RESPONSABILIDADE LIMITADA. SÓCIO DISSIDENTE. CRITÉRIOS PARA APURAÇÃO DE HAVERES. BALANÇO DE DETERMINAÇÃO. FLUXO DE CAIXA. 1. Na dissolução parcial de sociedade por quotas de responsabilidade limitada, o critério previsto no contrato social para a apuração dos haveres do sócio retirante somente prevalecerá se houver consenso entre as partes quanto ao resultado alcançado. 2. Em caso de dissenso, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça está consolidada no sentido de que o balanço de determinação é o critério que melhor reflete o valor patrimonial da empresa. 3. O fluxo de caixa descontado, por representar a metodologia que melhor revela a situação econômica e a capacidade de geração de riqueza de uma empresa, pode ser aplicado juntamente com o balanço de determinação na apuração de haveres do sócio dissidente. 4. Recurso especial desprovido. (REsp 1335619/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, Rel. p/ Acórdão Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, TERCEIRA TURMA, julgado em 03/03/2015, DJe 27/03/2015).”
É de se destacar, que o fluxo de caixa descontado avalia o negócio em si e, portanto, leva em conta a capacidade da sociedade gerar receitas [projeção de caixa] para cinco ou dez anos, trazidos a valor presente, mais um valor residual a título de perpetuidade. É, portanto, método que parte de uma aposta de que determinada sociedade continuará a se comportar de certa maneira no futuro, com certa rentabilidade, estável ou crescente, muitas vezes discrepantes quanto ao real desempenho futuro da sociedade. É de se destacar, que inúmeras incertezas podem comprometer tal expectativa, como taxa de crescimento do PIB, taxa de juros, desemprego etc.
Ou seja, enquanto o valor econômico apura o negócio e a projeção de gerar receitas, o valor patrimonial afere o valor de mercado dos ativos da sociedade, incluindo o estabelecimento comercial.
Contudo e apesar da jurisprudência há longos anos estar consolidada no sentido da utilização da metodologia do fluxo de caixa descontado para apuração de haveres, em caso de dissolução parcial de sociedade, a legislação pátria estabelece que no caso de inexistência de definição no contrato social, a apuração dos haveres deve ser realizada com base no valor patrimonial, conforme artigo 1.031 do Código Civil e artigo 606 do Código de Processo Civil:
“Art. 1.031. Nos casos em que a sociedade se resolver em relação a um sócio, o valor da sua quota, considerada pelo montante efetivamente realizado, liquidar-se-á, salvo disposição contratual em contrário, com base na situação patrimonial da sociedade, à data da resolução, verificada em balanço especialmente levantado”.
“Art. 606. Em caso de omissão do contrato social, o juiz definirá, como critério de apuração de haveres, o valor patrimonial apurado em balanço de determinação, tomando-se por referência a data da resolução e avaliando-se bens e direitos do ativo, tangíveis e intangíveis, a preço de saída, além do passivo também a ser apurado de igual forma. (…)”.
Ou seja, o critério consagrado na jurisprudência dos tribunais era dissonante do estabelecido em lei. Em boa hora, o Superior Tribunal de Justiça (“STJ”), no âmbito do julgamento do Recurso Especial 1.877.331-SP (“REsp STJ”), ocorrido em 13 de abril de 2021, alterou referido entendimento e estabeleceu que os haveres devem ser apurados com base no valor patrimonial aferido no âmbito do balanço de determinação.
Em seu voto vencedor, o Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, fundamentou a obediência ao critério legal (patrimonial) por considerar o mais acertado, ao passo que o econômico (do qual deflui a metodologia do fluxo de caixa descontado), além de ser inadequado para o contexto da apuração de haveres, pode ensejar consequências perniciosas, tais como (i) desestímulo ao cumprimento dos deveres dos sócios minoritários; (ii) incentivo ao exercício do direito de retirada, em prejuízo da estabilidade das empresas, e (iii) enriquecimento indevido do sócio desligado em detrimento daqueles que permanecem na sociedade.
O Ministro ainda destacou que, o reembolso do sócio desligado em função das perspectivas de rentabilidade da sociedade implica sérias contradições, pois o sócio desligado, nesse caso, terá assegurado um retorno ao investimento sem estar correndo os riscos correspondentes. Isto é, a partir da resolução parcial da sociedade, ele deixa de ser sócio e, consequentemente, não corre mais nenhum risco empresarial em relação àquela empresa. A metodologia econômica de avaliação procura quantificar exatamente o retorno que o investimento naquela sociedade tende a proporcionar, num prazo definido, a quem for sócio dela. Mas esse retorno pode ou não existir, em razão dos riscos próprios da atividade empresarial. Trata-se de simples estimativa. Com a adoção do critério econômico na apuração de haveres, o sócio desligado tem assegurado um retorno projetado de um investimento sem correr minimamente o risco correspondente, o que não é razoável.
Em complemento e na ausência de previsão no contrato social, os haveres devem ser pagos ao sócio retirante, excluído ou aos herdeiros do falecido, em até 90 dias, sendo os efeitos da utilização da metodologia do fluxo de caixa descontado mais perversa a danosa, pois a sociedade deverá desembolsar, em tal prazo, quantia disponível atualmente em seu caixa para pagamento de haveres calculados com base em prováveis rendimentos futuros e sem que o sócio retirante suporte os riscos futuros.
Neste sentido, entendemos que a alteração da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça foi salutar, especialmente levando em conta a preservação da empresa, princípio fundamental do moderno direito societário.
Rodrigo Elian Sanchez
É Possível Realizar Inventário e Partilha Extrajudicial, Mesmo Havendo Testamento, Menores ou Incapazes?
Com relação ao inventário e partilha extrajudicial, em casos em que há testamento, a resposta é SIM. Já com relação aos casos em que há menores ou incapazes, os poderes legislativo e judiciário estão caminhando para que seja possível.
O entendimento do Superior Tribunal de Justiça sobre a possibilidade de se realizar o inventário e a partilha de bens de forma extrajudicial quando há testamento – sem menores ou incapazes, e desde que não haja litígio entre os herdeiros – já está consolidado.
Embora o artigo 610, do Código de Processo Civil, vede expressamente o inventário e partilha extrajudicial nestes casos, a Ministra Nancy Andrighi esclareceu que é necessário que o Poder Judiciário faça uma interpretação teleológica[4] e sistemática do Código de Processo Civil (REsp 1.951.456).
Em outras palavras, a Ministra frisou em seu voto que, “a exposição de motivos do projeto de lei que criou a possibilidade de inventários extrajudiciais no Brasil [Lei nº 11.441/2007] revela que o legislador teve a preocupação de impedir a sua prática quando houvesse testamento em razão da potencial existência de conflitos”, mas conclui que “sendo os herdeiros capazes e concordes, não há óbice ao inventário extrajudicial, ainda que haja testamento”.
Para tanto, basta que as partes interessadas ajuízem um simples pedido de alvará judicial, requerendo a autorização para a lavratura da escritura de inventário extrajudicial.
Seguindo esta mesma linha de raciocínio, e amparado na jurisprudência, o Legislativo está analisando a possibilidade de alterar o texto do artigo 610 do CPC, para ampliar as possibilidades de inventário e partilha extrajudicial, para abarcar os casos de existência de testamento, bem como menores ou incapazes.
O projeto de Lei 606/22[5], prevê que “no caso de haver interessado menor ou incapaz, o juiz poderá conceder alvará para que o inventário e partilha sejam feitos por escritura pública, após manifestação do Ministério Público, desde que: a partilha seja estabelecida de forma igualitária sobre todo o patrimônio herdado; todos os interessados concordem; seja apresentada a minuta final da escritura, acompanhada da documentação pertinente. No caso de inventário e partilha extrajudiciais, o tabelião somente lavrará a escritura pública, se todas as partes interessadas estiverem assistidas por advogado ou por defensor público, cuja qualificação e assinatura constarão do ato notarial.
A justificação para a alteração da lei, assevera que “a temática da sucessão hereditária tem evoluído no Direito Brasileiro ao longo dos anos. Especificamente, em 2007, a Lei nº 11.441 possibilitou a realização de inventários e partilhas extrajudiciais nos cartórios de notas desde que atendidas exigências como inexistência de testamento, não haver menores ou incapazes e existir consensualidade entre os interessados. Desde então, o país testemunha uma maior celeridade nos processos de sucessão, o que facilitou a vida dos cidadãos e desafogou o Poder Judiciário, posto que inúmeros processos deixaram de ser necessários. Além disso, houve economia de dinheiro público. Diante dos benefícios vivenciados com a possibilidade da lavratura da escritura de inventário e partilha extrajudicial, buscamos estender essa possibilidade também aos casos em que haja testamento ou incapazes, atendidos determinados requisitos.”
Recentemente, dois magistrados de comarcas do interior do estado de São Paulo proferiram decisões, em que concederam alvará para lavratura de escritura de inventário e partilha em cartório de notas, mesmo existindo herdeiro menor, já que a partilha se daria de forma ideal, (processos nº 1016082-28.2021.8.26.0625 e nº 1002882-02.2021.8.26.0318).
Importante destacar que tanto as portarias dos Tribunais de Justiça Estaduais, que já autorizam a lavratura do inventário e partilha em casos em que haja testamento, assim como o Projeto de Lei 606/22 – que amplia tal possibilidade para os casos que envolvem menores e incapazes – ao mesmo tempo em que buscam celeridade e desburocratização dos processos sucessórios no país, resguardam a proteção dos incapazes, pois exigem a intervenção jurisdicional prévia, ouvido o Ministério Público.
Marcelo Barretto Ferreira da Silva Filho
Utilização Inadequada de Informações de Terceiros Pode Caracterizar Falta Grave de Empregado.
De acordo com a Lei Geral de Proteção de Dados – “LGPD”, as empresas são responsáveis por utilizar de forma correta e manter o sigilo sobre informações de terceiros que possuem em seus bancos de dados.
Consequentemente, os empregados que possuem acesso a essas informações, têm a obrigação de utilizá-las de forma correta e apenas com a finalidade para a qual a informação foi obtida, sob pena de cometer falta grave.
Caso um empregado utilize de forma inadequada a informação de terceiros em posse da empresa, ele pode ser punido com advertência, suspensão e até demissão por justa causa, dependendo do grau de gravidade da conduta e suas consequências. Já há, inclusive, decisões judiciais neste sentido.
Dependendo da situação e da informação utilizada de forma inadequada, o empregado pode ser despedido por justa causa com fundamento no artigo 482 alínea “a” [ato de improbidade], alínea “b” [incontinência de conduta ou mau procedimento] ou alínea “h” [ato de indisciplina ou de insubordinação].
O enquadramento nas hipóteses de demissão por justa causa previstas no artigo 482 da CLT, deverá ser definido caso a caso.
Como em qualquer demissão por justa causa, é importante que a empresa registre o ocorrido e as provas através de documentos.
A elaboração de regulamento sobre a utilização de informações pelos empregados, pode ser importante para as empresas garantirem a utilização adequada das informações e para respaldar a aplicação de penalidade ao empregado que utilizar a informação de forma inadequada.
Eduardo Galvão Prado
Todos os direitos reservados – Rodrigo Elian Sanchez Sociedade de Advogados S/S.
[1] GALANTER, Marc. Why the haves come out ahead? Speculations on the limits of legal change Volume 9:1 Law and Society Review, 1974, pp. 95-96.
[2] BEDI, Suneal e MARRA, William C. The Shadows of Litigation Finance. Vanderbilt Law Reveiew. Volume 74, Nember 3, 2021, p. 597.
[3] Coelho, Fábio Ulhoa. O valor patrimonial das quotas da sociedade limitada. In: Novos estudos de direito comercial em homenagem a Celso Barbi Filho. Rio de Janeiro: Forense, 2003, págs. 59-60.
[4] [Filosofia] Capaz de relacionar um acontecimento com seu efeito final.
[5] Fonte: Agência Câmara de Notícias